segunda-feira, 28 de abril de 2008

ARTE-EDUCAÇÃO


Arte-educaçãoApril 28th, 2008

por Fabiana Langaro Loos

Nos dias 17 e 18 de abril de 2008, a Fundação Cultural de Balneário Camboriú realizou, no Hotel D´Sintra, o “III Seminário de Balneário Camboriú: Arte-educação em Perspectiva”, que contou com diversas palestrantes de Santa Catarina, entre mestres e doutoras com formação em arte-educação, muitas delas oriundas de Itajaí, as quais podemos destacar Ane Fernandes (artes visuais), Mônica Uriarte (música), Márcia D´Avilla (artes visuais), Silvana Rocha (artes visuais) e Valéria Maria de Oliveira (teatro). Ainda estavam presentes, Drª Sandra Ramalho e Fabíola Costa, de Florianópolis, a artista plástica Isabel Mir, de Indaial, Carla Carvalho, de Blumenau, Drª Nadja de Carvalho Llamas, Drª Sílvia Sell Duarte e Eliana Stamm, de Joinville e a presidente da Fundação Cultural de Balneário Camboriú, a arte-educadora e ceramista Olinda Schauffert.


O intuito do seminário foi discutir questões ligadas ao ensino da arte nas escolas das redes públicas e privadas de ensino, e ressaltar a importância da educação em arte, a fim de propiciar o desenvolvimento do pensamento artístico e da percepção estética, que caracterizam um modo próprio de ordenar e dar sentido à formação do aluno e, de uma forma mais abrangente, do ser humano. O seminário foi gratuito, teve uma intensa programação de dois dias, nos períodos matutino e vespertino, e contou com a participação de mais de 300 professores, vindos de diversas cidades de Santa Catarina, como Blumenau, Itajaí, Balneário Camboriú, Florianópolis, Timbó, Indaial, Joinville, Penha, Navegantes, entre outras.


As palestras foram de significativa importância para mostrar ao professor de artes a necessidade de sua presença nos aspectos culturais da cidade, participando ativamente de exposições de artes, concertos musicais, teatro, artesanato e saraus literários. Enfim, de nada adianta o professor ensinar arte em sala de aula e, na prática, estar ausente da programação cultural do local onde reside, ou seja, não vivenciar a arte. Segundo a arte-educadora e artista plástica Isabel Mir, “cabe ao educador perpetuar os dogmas da arte contemporânea, ou questioná-los, inovando na missão de entender, apreciar e fazer arte”. Toda linguagem artística é uma maneira particular e única do homem pensar e questionar sua presença no mundo, pois a arte ajuda a compreender nosso tempo em uma perspectiva sócio-cultural.


Em nosso país há uma grande diversidade cultural. É importante acreditar nas diferenças, na liberdade de expressão, na produtividade e na criatividade de nossos artistas. Mais importante ainda, é formar cidadãos com vontade de participar de atividades culturais e formar apreciadores da arte, conseqüentemente, seres com uma visão crítica do mundo. Cada um de nós ouve, observa e entende conforme sua bagagem, não é possível enxergar com os olhos dos outros. É preciso respeitar o contexto de cada indivíduo. A arte é uma área específica de conhecimento, da mesma forma que todas as outras disciplinas. Assim, arte é capaz de propiciar conhecimento, lazer, trabalho e idéias, oferecendo a todos uma melhor consciência do mundo.


Portanto, professor, aluno, cidadão, viva a arte, faça arte, integre-se à arte.

VIOLA CAIPIRA

A VIOLA CAIPIRA
Isabel Mir Brandt[1]


O folclore, ciência considerada indispensável para o conhecimento social e psicológico de um povo. e é encontrado na literatura sob a forma de poemas, lendas, contos, provérbios e canções, assim como nos costumes tradicionais como danças, jogos, crendices e superstições, bem como, nas artes e nas mais diversas manifestações da atividade humana. Pode-se dizer que o folclore traduz ao vivo a alma de um povo, pois é específico e genuíno.

Apesar do estudo do folclore ser relativamente recente, pois se originou há cento e cinqüenta e dois anos, o folclore, em si, é a cultura mais antiga da humanidade, mais velha do que a história, pois mesmo antes que a ciência existisse, já os mitos, as lendas e o artesanato eram transmitidos através das gerações desde os remotos tempos pré-históricos, principalmente por via oral. O folclore, apear de não percebermos, acompanha a nossa existência e tem grande influência na nossa maneira de pensar, sentir e agir.

Entre as inúmeras e valiosas manifestações do folclore brasileiro, vamos encontrar a viola caipira que é um instrumento de corda trazido pelo colonizador português, ao som da qual cantava para curtir a saudade da pátria distante. Tem cinco ou seis cordas duplas, metálicas: as duas primas e segundas eram de aço, a terceira era feita de metal amarelo (latão), enquanto o bordão de ré era de aço, o de lá e o mi, de latão. Desde a introdução da viola pelos portugueses durante o processo de colonização dos Brasil, até a difusão pelos mais remotos lugares durante a expansão bandeirante, a viola sempre fez parte da cultura musical brasileira, onde é por excelência um instrumento musical do meio rural.

Um dos maiores estudiosos do folclore brasileiro foi o Professor Alceu Maynard de Araújo, que nos deixou como legado entre tantos outros, o estudo sobre a viola caipira. Trata-se de um dos mais completos registros históricos feitos no Brasil sobre o tema, e foram publicados na Revista Sertaneja de números 4, 5, 6, 7, 8, 9, 13 e 14, entre julho de 1958 a maio de 1959. São desses estudos que as principais características da viola caipira e seus tocadores ficam registrados, dessa forma, os grupos de viola caipira que se inserem dentro dos conceitos do folclore brasileiro devem manter certas características como a utilização do ponteio de cordas soltas, o uso de palheta ou dedeira e chocalhos. Também o violeiro deve vestir-se com chapéu de palha, camisa, calça e botinas.

Araújo nos conta que com o desenvolvimento das cidades e em conseqüência o esvaziamento populacional do campo onde a viola tinha reinado até o fim do século XIX, ocorre uma valorização dos costumes urbanos e uma depreciação de tudo que era oriundo do campo. A viola passa a fazer parte não mais do cancioneiro cotidiano das cidades onde o violão assume o lugar de importância. A viola passa a fazer parte do folclore brasileiro através do folclorista Cornélio Pires que em 1910 organizou um festival de Viola Caipira em São Paulo no Mackenzie College, com o intuito de manter viva essa tradição musical.

Atualmente a viola caipira voltou ao seu lugar de importância pela integração cultural realizada em todo o território brasileiro através dos canais de rádio e televisão e de uma programação cultural voltada a valorização e integração do folclore e costumes do homem do campo nas cidades, impulsionada e patrocinada pela agroindústria. Aos poucos a viola caipira sai das festas familiares nas fazendas e sítios do interior, e seus violeiros aventuram seus cantos e duelos nas praças, feiras e rodeios do imenso Brasil, afirmando a viola caipira e seu cancioneiro como uma das mais fortes e antigas manifestações da cultura brasileira.

Biografia: ALCEU MAYNARD ARAÚJO nasceu no dia 21 de dezembro de 1913, na cidade de Piracicaba, SP. Formou-se professor em 1930 e veio para São Paulo, ingressando no Curso Colegial e Científico do Colégio Ipiranga. Em 1944 bacharelou-se na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, depois do que exerceu diversas funções e pertenceu a diversas entidades. Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e da Sociedade Brasileira de Folclore. Divulgou o Brasil através de filmes de sua autoria, no programa da TV - PRF-3, "Veja o Brasil". Na área do Folclore publicou: Cururu (1948), Danças e ritos populares de Taubaté (1948), Folia de Reis de Cunha (1949), Rondas infantis de Cananéia (1952), Literatura de cordel (1955), Ciclo agrícola, calendário religioso e magias ligadas às plantações (1957), Poranduba paulista (1958), Folclore do mar (1958), Medicina rústica (1961), Novo dicionário brasileiro - verbetes de folclore (1962), Folclore nacional (1964), Pentateuco nordestino (1971), além de muitos ensaios e artigos na imprensa brasileira e revistas especializadas. Falecido em 1974.

Isabel Mir
Ms Educação e Cultura
SER ESCRAVO É BOM!
Minha vida politicamente incorreta”

Sabe aquele dia que você tem vontade de voltar ao passado? Pois é... Acordei com vontade de ser escrava no tempo do Brasil Colonial.

Porque devia ser bom trabalhar de sol a sol, o que hoje não faço já que a tecnologia da iluminação artificial transformou minha noite em dia, hoje trabalho de dia-a-dia.

No tempo da escravidão eu iria a pé e de graça para o trabalho cantando com meus companheiros, hoje para andar sem ser atropelado, assaltado ou cair em algum buraco das calçadas, é preciso pagar muitos impostos e uma “tal” de academia para ficar em forma.

No tempo da escravidão tinha o capataz, que cuidava da produção, mas também protegia os escravos de possíveis ataques dos bandidos das redondezas. Hoje temos a polícia, a justiça, as leis, e a turma dos direitos humanos que protegem os bandidos, daí o grande impasse da atualidade “ser ou não ser” bandido.

No tempo da escravidão, escravo mal alimentado ou doente era prejuízo na certa, então era preciso alimentá-los e manter, médico, curandeiro, benzedeira, além de uma farta farmácia de remédios caseiros a base ervas naturais para qualquer eventualidade. Hoje temos os hospitais que se transformaram em centros mortuários, já que acreditamos que ninguém morre, porque está proibido morrer tranquilamente em casa.

No tempo da escravidão os filhos bastardos iam estudar na Europa, tornavam-se os doutores, em direito e em medicina, e até lutavam pela liberdade dos seus parentes. Hoje os filhos bastardos lotam os laboratórios para análise de paternidade, tornam-se bandidos e matam os seus pais.

No tempo da escravidão não tinha aposentadoria, o escravo nascia e morria na propriedade do seu senhor, não se preocupava com a casa própria, aluguel, impostos, o fazendeiro que se virasse com essas coisas chatas. Além do mais o trabalho era classificado por gênero, faixa etária e força física. Hoje os jovens são proibidos de trabalhar, mas não de “bandidar”.

No tempo da escravidão, se o escravo roubava, estuprava, assassinava, ou fazia outros tipos de delitos como transar e engravidar a filha do senhor ia para o tronco, levava tantas e outras chibatadas, de acordo com a gravidade do delito não importava a idade do escravo. Hoje um bandido, bem barbudo, malhado, com 1,80m de altura e 86kg, mas que ainda tem 17 anos é considerado uma pobre criança que deve ser protegida pela lei e pelos direitos humanos.

Hoje você consegue um trabalho desumano, trabalhando na boca do forno, num ambiente de 40º, com um salário mínimo que só permite a vida vegetativa, e ainda está com medo de ser despedido.

Dá ou não dá vontade de ser escravo? Ou melhor dizendo... Senhor de Escravos.

Isabel Mir
www.isabelmir.com.br

quarta-feira, 23 de abril de 2008

CUBA LIVRE - era uma bebida dos anos 70

“Minha vida politicamente incorreta”

Isabel Mir

Nestes tempos conturbados, dominados por notícias das guerras de aqui e acolá, resolvi contar o que andei aprontando não faz muito tempo na ilha de Fidel.

É que foi pura coincidência eu estar em Havana no mesmo dia em que o ator americano Kevin Costner, estava lançando o seu filme sobre os mísseis russos da Baia dos Porcos, que os cubanos não conseguiram montar, ou já os teriam disparado contra os EUA e eu não estaria neste mundo para contar esta história, dentro de outras tantas inacreditáveis para os fãs Del Comandante Fidel. Bastou um único dia na paradisíaca ilha de Fidel para meu sonho do perfeito mundo socialista desmoronar.

O Hotel onde me hospedei juntamente com meu marido, ficava a duas quadras da embaixada soviética, que é a mais espetacular fortaleza da engenharia de guerra que eu já vi, nem mesmo nos efeitos especiais dos filmes americanos, que sequer chegam perto da realidade, que pode ser vista, mas não pode ser fotografada, nem filmada, nem com uma câmara oculta, pois quando tentei sair de Cuba com algumas imagens, tive todos meus pertences saqueados, pelo pessoal da camisa vermelha de Chaves, já em terras venezuelanas, onde estranhamente minha bagagem extraviada foi parar.

Mas voltemos a Havana, ao Hotel Nacional, ao Fidel e ao Kevin.

Como os cubanos, cidadãos normais, jamais sabem o que está acontecendo nas mansões da elite do partido cubano, muito menos o que acontece nos luxuosos hotéis dos quais estão proibidos de se aproximar, sob a ameaça de serem presos pois podem estar conspirando contra Fidel com algum estrangeiro, resolvi dar uma oportunidade a um casal de cubanos de pelo menos uma só noite se sentirem livres para realmente fazerem aquilo que Fidel tanto teme, ver de perto a riqueza e opulência da elite cubana.

O plano iniciou com um convite para que um casal de cubanos, ele um engenheiro e ela uma economista que nunca estudou sobre globalização e muito menos sobre capitalismo, fossem nossos guias turísticos pela velha Havana, e entre uma e outra foto, apresentamos nosso plano, que foi aceito de imediato, nem que isso lhes custassem a vida.

No dia seguinte conseguimos com que o casal fosse até nosso Hotel, onde a mulher deveria se passar por prostituta para poder subir até nosso quarto, o que é normal e aceito, pois a prostituição em Cuba também é estatal. No quarto a economista pela primeira vez em sua vida tomou um banho de água quente, sem falar no espanto que lhe causou quantidade e qualidade dos perfumes, cremes, maquiagem, que estavam a disposição dos hospedes como cortesia do hotel e começou a perguntar como essas coisas entravam em Cuba e eram doadas aos estrangeiros.

Quando ela saiu do quarto estava irreconhecível, era uma perfeita turista, maquiada, cheia de bijuterias, com roupa de moda, óculos de sol, disfarçada o suficiente, para sair do hotel sem ser reconhecida. Quanto ao seu companheiro, o engenheiro, uma camisa pólo da Lacoste foi o suficiente para o disfarce, já que sua aparência física tinha sido herdada do seu avô americano.
E lá fomos os dois casais com o carro japonês que alugamos, rumo ao Hotel Nacional.

Assim que chegamos já no estacionamento nossos dois acompanhantes ficaram por alguns segundos em estado de choque, imóveis, pareciam não acreditar no que estavam vendo, depois começaram a falar baixinho um com o outro... Pensávamos que tinham desistido do plano, mas logo o engenheiro quis saber se era verdade uma história que ele tinha ouvido quando criança antes de seu avô morrer na prisão. Referiu-se a uma rosa-dos-ventos que deveria estar nesse hotel.

Ao ser informado que era verdade, e que podíamos levá-los até a sua localização nos jardins do hotel, o casal novamente se animou e lá fomos nós... Bem só até o salão onde estavam sendo preparadas as mesas do banquete que seria servido logo após a exibição do filme.

Não havia forma de fazermos os dois dar mais um passo, os olhos fixos na prataria e na cristaleria das mesas, os arranjos de flores e frutas... Maravilhada ela queria tocar, saber se era de verdade... Falamos que corríamos perigo de vida se eles demonstrassem qualquer sentimento que não fosse o de um turista, e logo os dois se refizeram das emoções e conseguimos atravessar os vários salões da festa, nos abastecendo com tacas de um delicioso champanhe que estava sendo servido a vontade e ainda vimos o Kevin Costner esperando pacientemente o Fidel que ainda não tinha chegado para a festa porque estava discursando há mais de 6 horas para os repórteres que cobriam o evento. Procurando evitar conversa e nem dar tempo de que alguém se aproximasse do nosso grupo para não sermos identificados, nos dirigimos até os jardins do Hotel Hacional que deixariam Nabucodonosor morto de inveja, pois com certeza superam os jardins da antiga babilônia. E lá estava a enorme rosa-dos-ventos feita de mosaicos no piso do grande deque projetado sobre o esverdeado mar do caribe, contrastando com as diversas matizes dos mármores do mosaico.

Os dois pediram que esperássemos na parte de cima do deque, e se dirigiram abraços caminhando em direção a ponta mais extrema se ajoelharam e começaram a chorar.
A cena nos deixou novamente em pânico, e nos aproximamos rapidamente para tentar disfarçar e saber o que estava acontecendo. A resposta veio de um gest0o do engenheiro cubano que com a mão tremula e o peito pulsando aos soluços apontou para o mar e disse:
- São 140 km para a vida e a liberdade.

Se o nosso plano era mostrar a rica elite cubana, o deles era pular no mar e nadar até os EUA.
Perdemos a exibição do filme. Ficamos conversando no jardim para que desistissem de pular no mar. Mas pretendíamos ainda aproveitar o banquete, mas novamente ficamos em panico quando o casal nos informou que tinham que voltar para casa, pois se não estivessem no cortiço onde viviam até a meia-noite, a polícia do quarteirão seria acionada, e eles teriam que contar onde estavam, com quem, e o que faziam, e que nós é que iríamos para na cadeia.

Não foi preciso muita conversa, logo entendemos. Difícil foi passar pelo salão do banquete e voltar para o hotel sem jantar e sem uma foto ou autógrafo do Kevin.

Mas o final dessa aventura toda é que o casal com as nossas roupas doadas e passaportes falsos que uma ONG canadense conseguiu para eles, fugiram de Cuba e hoje vivem numa pequena cidade nos arredores de Paris. Só não estão totalmente livres e felizes, porque o castigo para as famílias daqueles que conseguem fugir de Cuba é a total privação dos “benefícios socialistas”, ou seja o vale refeição, escola, saúde e moradia, transformando os pobres parentes em parias da sociedade cubana, o que é uma grande economia para o estado socialista de Fidel, já que milhares de cubanos tem um ou outro parente que fugiu. Mas o lado bom é que os fujões encontraram um jeito de alimentar um mercado negro, administrado pela elite do partido de Fidel, onde a moeda corrente é o dólar que entra aos milhares pelas mãos dos turistas, que entregam para parentes sobreviverem desse mercado negro, e assim escaparem pelo menos de morrer de fome na ilha de Fidel.

Isabel Mir/ janeiro/2008

ARTE RESISTENCIA

ARTE RESISTÊNCIA[

Isabel Mir Brandt

Resumo: Este texto ressalta a preocupação que, como arte-educadora, tem se tornado tema de pesquisa com relação aos desafios e dilemas pessoais que enfrento também no fazer artístico do meu dia-a-dia como artista contemporânea, bem como na avaliação que fazemos do fazer arte na atualidade. Este texto é um relato de experiência a partir das impressões deixadas por um grupo diferenciado de freqüentadores do meu atelier de escultura, os estudantes da rede pública de ensino e seus arte-educadores.

Palavras chaves: arte-educação, arte contemporânea, arte resistência.
Abstract: This text emphasizes the worry I have as an art teacher. It has become a subject of research in relation to the individual challenges and doubts that I face in the artistic work and also part of my daily life as a contemporary artist, as well as the art evaluation of making it nowadays. This text is also a narrative of the experience I had through the impressions left by a distinct group of people that visited my sculpture workshop, the students of the public sector and their art teachers.
Key-words: art teachers, contemporary art, resistance art.

1. Introdução:

Como chegamos até a arte contemporânea:

O início do século 20 trouxe para a arte a abstração, ou seja, uma representação não-figurativa, na qual o olhar espectador não reconhece de imediato o objeto representado, levando a questionamentos e interpretações. Se o século 19 trouxe respostas práticas por intermédio das grandes invenções e do desenvolvimento da tecnologia, e a busca do homem coletivo integrado na sociedade, o século 20 estabeleceu outros parâmetros. A atenção se volta para dentro do ser humano, com a valorização não mais das grandes causas, mas do individual, do micro ser dividido entre o coletivo e o individual, entre o mundo público vigiado pelas câmeras e o privado dos sentimentos e ações inconfessáveis.

Da mesma forma, o cubismo de Picasso e a arte concreta, expressão cunhada pelo holandês Theo van Doesburg (1883-1931) em 1918, vão dar o caminho que a arte seguiria até a metade do século 20, ou seja, o de sua rotulação. Na necessidade de buscar cada vez mais a individualização, a arte se fragmenta em tendências. Ferreira Gullar, em 1959, publica o manifesto no qual ressalta as diferenças entre os concretistas e os neoconcretistas.

Na metade do século 20, outra questão: a pop art. O que Andy Warhol (1928-1987) propôs é que o artista antecede a própria obra. É a assinatura que leva o observador a reconhecer obra. Seria o nascimento da grife na arte. O valor não está mais na obra, mas na assinatura. Dos anos 60 para cá, não importa muito o que o artista cria, mas o seu currículo, sua assinatura. Todo tipo de lixo-arte pode ser apresentado nos grandes salões, desde que assinados por um currículo.

2. Sem Fundamentação Teórica:

A Arte na Universidade:

Quando os cursos universitários de arte se popularizam, nasce o movimento conceitual. O artista busca por intermédio do conhecimento dar à sua obra o rótulo da "arte inteligente". Levar objetos do cotidiano transmutados para os grandes salões, deliciar-se com a incompreensão dos observadores é colocar o artista na elite intelectual, dentro da academia, do grupo seleto em que a idéia antecede a obra. São os neofigurativos. Obras como um prato vazio colado numa tela em que o observador reconhece se tratar de um prato, mas que, na verdade da interpretação inteligente de seu criador, é a figuração da fome, deixando realmente o observador com fome de arte.

Da mesma forma em que as exposições comerciais ou salões se multiplicam, o observador, que é constantemente chamado de inculto, vai aos poucos estudando a tal arte conceitual, e se transforma no artista de fundo de quintal, que cola três gravatas numa tela, pinta por cima com uma cor fria e se intitula contemporâneo, cujo conhecimento sobre arte foi recém adquirido num curso. Fala sobre sua própria arte com o linguajar fluente dos críticos ao abordar temas como textura, linhas, profundidade, conceito, figuração etc.

Quando o neofigurativo é apropriado pelos artistas autenticados pelos diplomas da academia, a "arte inteligente" extrapola os ambientes expositivos acadêmicos para se lançar numa outra idéia, a da "instalação". A arte não pode ser mais repetida, comprada, colecionada, ela é efêmera. O observador tem de ir ao encontro dela, correr, ver, posicionar-se diante da obra e registrar a imagem na foto, antes que termine seu tempo. Ao artista criador cabe o registro na mídia, o impacto causado, o estranhamento documentado e adicionado ao currículo.
Algumas tendências da arte contemporânea serão eternizadas apenas pela foto arquivada na seção "Arte" dos arquivos documentais históricos e não mais nos museus, porque é mais barato arquivar uma foto do que manter conservada por anos uma obra de arte nas acervos das instituições.

3. A metodologia anti-científica:

A arte objeto de consumo rápido:

Dessa forma, bem-vindas sejam as "instalações" que podem incluir performance, objeto, vídeo, e principalmente o observador, estabelecendo uma interação entre eles. A inclusão do observador nesse processo é necessária para a dar autenticidade à obra com o intuito de levar as pessoas a tomar consciência do seu espaço, do seu corpo e de sua realidade.

Enfim, a arte do século 20 faz o seu observador passar de inculto a inconsciente de si mesmo e da arte a salvadora do homem. Entra em discussão um novo rótulo: a "arte-terapia", a salvadora de todos os males do novo homem que vão dos físicos até os morais. Proliferam as "escolinhas de arte", de inclusão social.

Essa nova modalidade de incluir e ser incluído cria a "performance", que consiste em transformar o artista em produtor da obra de arte teatral. Tudo é arte, tudo vira arte, tudo pode ser arte ou tudo pode ser incluído, do lixo às paisagens, da música aos gestos, desde que apresentado de forma teatral. E da mesma forma que a foto registra a instalação, o vídeo registra a performance. Nasce o mais recente rótulo da arte contemporânea, a videoarte.

Mas é nos bastidores dos grandes museus e galerias que administradores, financiadores, curadores e críticos compactuam felizes sobre as novas tendências da arte contemporânea. Primeiro porque fazer uma exposição de fotografias é de baixíssimo custo. As fotos chegam via internet e logo são impressas em equipamentos de alta tecnologia a custo mínimo. Os custos da videoarte, já produzida pelo artista, ficam dependendo da disponibilidade ou não do equipamento de projeção. À pintura sobre tela e à escultura, sejam elas deste ou aquele outro rótulo da arte contemporânea, restaram o mais importante item a ser observado nos editais e regulamentos dos espaços expositores: o transporte e seguro das obras, que deve ser única e totalmente responsabilidade do artista.

Assim, para os organizadores e curadores dos salões, uma escultura em aço que necessite de condições especiais de transporte, pelo seu volume e peso, é uma obra menor diante de algum objeto mínimo que chegue pelo correio a custo zero.

4. Descrição e análise do que?

Arte é um registro na mídia:

E quem são esses artistas que conseguem bancar a exposição de obras produzidas com altos custos e que não são vendáveis, apenas de vivência efêmera nos salões? Quem os patrocina? Se essa arte não é feita para o observador transformar-se em possuidor da obra? Se após o encerramento do salão a grande maioria dos trabalhos contemporâneos é abandonada por seus criadores, uma vez que o mais importante é o catálogo que será incluído no currículo? Nem ouso sugerir.

O resultado é que as instituições públicas promotoras de salões, sob a bandeira da arte-inclusão, estão conseguindo criar um novo contingente de excluídos, que pessoalmente rotulei como os "refugiados da arte contemporânea". Eles criaram seus próprios refúgios, sob as mais precárias condições de sobrevivência nos seus ateliês e oficinas.

5. A oralidade:

A arte resistência:

Existe uma arte subterrânea, longe do glamour e dos holofotes da imprensa do espetáculo dos salões, que é gestada entre o criador e o possuidor. Uma arte que silenciosamente se desloca sobre uma malha de entendimento e afeto, onde a grife e o currículo do artista pouco importam. Existe, sim, um mercado de arte nesse campo de refugiados, dos incultos, dos inconscientes, dos excluídos, que os holofotes não focalizam, e dessa escuridão vem a sua própria sobrevivência. Seria necessário criar um novo rótulo para essa arte? Seria arte-resistência? Existir e resistir enquanto for possível até que nos encontrem e destruam.

Em 2007, abri as portas de meu atelier de escultura para um projeto da Fundação Indaialense de Cultura, juntamente com a Secretaria de Educação do município de Indaial/SC, onde os estudantes das escolas públicas, acompanhados de seus professores de artes e literatura, podiam conhecer o ambiente onde o fazer do artista se conjuga com o ato criativo. Em apenas uma semana cerca de trezentos e cinqüenta estudantes buscaram conhecer a arte contemporânea sob a visão do artista que a produz.

As visitas foram organizadas em grupos vinte alunos de cada vez e permaneciam cerca de uma hora no atelier para possibilitar um diálogo entre os estudantes de arte e a artista. Durante as visitas percebemos que os questionamentos mais comuns que os estudantes faziam a maioria estavam ligados as questões comerciais da arte. É possível viver só de arte? Quem compra esse tipo de arte? Quanto custa?

Na necessidade de respostas, abri outra porta do meu atelier, a parte da escritora, poeta, ilustradora, que comercializa seus livros, da escultora de obras por encomenda, dos contatos com galerias de arte comerciais, que expõem minhas obras contemporâneas, mas comercializam as obras que o comprador de arte busca, ou seja, as que se adaptam aos espaços privados ou públicos que lhes foram destinados.

6. Considerações Finais:

Entre o ser ou parecer artista contemporânea:

Ser uma artista contemporânea significa viver num castelo dogmático, transformando meu discurso em aversão a qualquer debate que possa se impor e derrubar a frágil estrutura de areia que o sustenta.

Viver nesse castelo dogmático significa desabonar e desencorajar qualquer crítica que venha de fora de sua lógica. Nesse castelo a opinião de Ferreira Gullar, um gigante das artes brasileiras, seria taxada de reacionária e conservadora. E se a crítica vem de fora da grande muralha que cerca os dogmas da arte contemporânea, o resultado é mais desalentador, pois nos grandes salões de arte os críticos foram substituídos por bajuladores do artista em detrimento de sua arte.

Assumir o dogma do ser artista contemporânea significa pertencer a um clã fechado em suas próprias idéias e que age de forma coordenada com o objetivo de colocar em prática uma teoria pré-estabelecida de que a arte contemporânea tem que perpetuar e ritualizar Duchamp e a arte conceitual, para não correr os riscos de ser descoberta como uma fraude do fazer artístico. Pelo menos é o que vemos nos outros habitantes do castelo conhecidos como curadores, galeristas e artistas fazendo a todo momento. È nesse ponto que o parecer prevalece sobre o ser.

Negar os dogmas, questionando sua temporalidade e validade, é habitar alem das muralhas do grande castelo, é se misturar com os periféricos, os desconhecidos, os incultos, para quem o artista contemporâneo cria suas obras com o único objetivo de “criar estranhezas”, tão comentadas pela mídia especializada nesse tipo de arte. È comum nos depararmos com uma mídia enaltecendo que tal obra de tal artista provocou a interatividade da obra de arte contemporânea com o espectador, quando o convidou a entrar por túneis, salas, sentar em estranhos objetos pontiagudos, entre outras situações, mais ou menos constrangedoras, que segundo o dogma, é uma forma de dizer que espectador e artista estão em contato através daquela obra, que trata-se de um esforço intelectual para a interatividade e um reforço para a simultaneidade, que a obra acontece junto com o momento presente da visitação, que o espectador é a parte do mundo que se relaciona com a obra e vice-versa.

Segundo o dogma, o ser periférico e desconhecido tem que estabelecer um comportamento crítico sobre ele e o mundo ao seu redor através de uma seqüência de copos quebrados espalhados pelo piso de um conceituado Museu de Arte Contemporânea. Esse ser periférico e desconhecido precisa ser conscientizado de que é normal ter sentimentos de constrangimento ou embaraço em determinadas situações de contato com a arte contemporânea.

7. Conclusão:
A missão do arte-educador:

Cabe ao arte-educador perpetuar os dogmas da arte contemporânea, ou questiona-los, inovando na missão de entender, apreciar e fazer arte.

8. Fontes Consultadas:

Indicar uma bibliografia dentro das normas para envio de artigos científicos envolve duas dificuldades: a primeira que não usei citações de autores ultra-conhecidos nos cursos universitários de arte como G. Argan, H. Leichtt, W. Benjamin, B. Berenson, H. Eco, E. Gombrich, A. Hauser, M. McLuhan, P. Mondrian, E. Panofsky, C. Peirce. Segundo que os autores consultados na sua grande maioria apenas publicam suas impressões através dos blogs e sites temáticos na WEB, cuja autenticidade pode ser questionada.
Alem disso usei como fonte palavras, expressões e vivencias coletadas na memória do meu fazer arte junto com meus interlocutores.

Mesmo assim disponho de farta bibliografia sobre arte na minha biblioteca pessoal a qual consulto raramente, preferindo consultar publicações que funcionam como um manual, um resumo, do muito que já foi escrito sobre o mesmo tema com as mesmas conclusões como, por exemplo, o livro “A Historia da Arte do Século XX: idéias e movimentos, de autoria de Lucio Agra, publicado pela Editora Anhembi Morumbi, em 2004”.




[1] Este texto foi formatado de acordo com as normas para envio de Artigos Científicos, mas a redação transgride as mesmas normas.
[2] A autora é Mestre em Educação e Cultura pela UDESC, Universidade do estado de Santa Catarina, artista plástica, escritora. Presidente do Conselho Municipal de Cultura de Indaial/SC. Membro da Sociedade de Escritores de Blumenau/SC. Membro da Associação de Artistas Plásticos de Timbó/SC. Site: http://www.isabelmir.com.br/. E-mail: isabelmir@tpa.com.br. Endereço: Rua São Bento, 740, Timbó/SC. Telefone: (47) 3382-9951. Link currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3478862065354935
[3] O resumo histórico foi elaborado a partir e inúmeros resumos já publicados, digitalizados e colocados para consulta em inúmeras páginas de WEB dedicadas a arte.
[4] A teoria “arte-inteligente” carece de fundamentação teórica, pelo fato de que é uma autocrítica quando a autora ainda freqüentava os quadros acadêmicos como pesquisadora e professora universitária do departamento de Artes.
[5] As constatações são resultados das visitas feitas pela autora através de um olhar crítico, aos mais recentes Salões de Arte Contemporânea.
[6] O registro fotográfico das obras contemporâneas e das obras comerciais da autora pode ser conferido através do site: http://www.isabelmir.com.br/

[7] O grifo no termo é proposital e pretende criar estranheza no próprio texto.