segunda-feira, 19 de setembro de 2011

ENCHENTE - JÁ ENCHEU...


Olha só até onde chegou o da aguá na Rua Nereu Ramos em Timbo. E eu trabalho ali na Arte Visual Painéis, que só aparece a pontinha da logo na nossa placa.
Era 5ª feira ao meio dia quando as águas começaram a invadir espaços onde nunca, em momento algum da historia de Timbo tinha enchente.
E as águas subiram em 12 horas 2m acima do nível da rua, não estou falando do nível do rio, mas do meio fio da rua.
Tem explicação? Isso mais parece um filme de suspense onde as autoridades resolvem abrir as barragens sem comunicar a população para não criar panico, e o povinho que se dane como sempre.
Porque sabemos como funciona os bastidores do poder... se o governo for culpado pela decisão de abrir as barragens, eles tem que nos indenizar, mas se a natureza for culpada, então temos que nos conformar, e assim seguimos em frente até a próxima enchente.

terça-feira, 14 de junho de 2011

MUITO FRIO

Esta muito frio aqui. Preciso renovar meu guarda roupa. Tem uns vestidinhos quentinhos que eu adoro usar. Minha dona me prometeu fazer uma nova seção de fotos com meus novos modelitos de inverno. Então até lá...

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009




ÁGUA TATUADA



Como o olhar consome a demora,
A mão devora o livro em construção.
Desaguando num aquário de luz.

Tudo quanto vejo é falso.

Água tatuada pelo olhar das aves no corpo da sombra.
Canta na curva do sal o que me esquece.
Jamais sossega a pele da tatuagem.
Nada cicatriza o mar

Nada mancha o espelho do teu olhar.

Onde a paixão ecoa e a água encosta a luz.
O desejo sobra na memória
Enquanto a demência se orvalha junto à mão.
Ou o rosto aquece a sombra.

A tatuagem nunca apaga a pele.
Soterrada sob um borrão de musgo.

Os barcos descem ao átrio da areia.
Só a água vela a penúria de um horizonte
Como cicatriz alastrada ao vento.
A pele dorme na água.
Respira enquanto o olhar dissolve a náusea,
como uma súplica riscada na pálpebra das pedras,
Nos destroços dos cristais mais se desce a pele da água.
como a tatuagem inaugura a insônia.

Só o vento sobrevive no fim das águias.
Quanto mais a pele se entrega ao corpo,
menos se desperta a parede cega.
Eu gostava de poder dormir junto ao ar.
Mas já não sei como atravessar o sono,
ou arrepender-me de estar vivo.
Nada do que asseguro fará sentido,
enquanto o sal da memória temperar a crueldade da paixão.
Só o gume da água segura este delírio.
Mesmo que uma janela cante na pele iluminada sob a tatuagem.
Nem sempre o mar consegue adiar o rosto.

O olhar movimenta paisagens adolescentes.
O vento é oblíquo.
A tarde amadurece numa ladainha de nódoas.
Tudo levita à passagem da tatuagem perplexa.

Ultimamente apóio-me muito nas paredes.
Às vezes ponho-me uma capa de sombras pelos ombros,
de onde assisto ao meu futuro.
E é a sorrir na água do teu olhar te estendo um discurso.
Já outros me disseram que não devemos descer à rua com rostos alugados.
Um filete de sangue aduba a tatuagem.
E um violão aquece-me a voz, como o um café expresso.
Embalado num delírio crepuscular,
adormeço as mãos para te expor às tempestades da pele.
Percorro-te com a língua os labirintos
Até onde a cabeça escuta as respirações do sangue.
Morre-se a boca na tez crepuscular, liquescência.
O sol é um tigre ferido às portas do sono.
Nunca outra ave me doeu no peito,
como o vôo adiado ou interrompido sob o sangue.
Eu trabalho para que o texto me amordace num beijo demorado.
Como a tatuagem esmaga a pele.
Sacudo o pó do coração com subtileza de uma pétala de gelo.
Assim como te evoco no saldo do desejo,
somos cruéis até onde se morde a voz.
Arde-me o corpo na cabeça onde não estou.
Devagar e tarde. Percorri o desejo até às portas do vento.
Entrego a tatuagem aos dias.
Que se pergunta como regressar à pele.
Porque a água foi percutida pela ansiedade.
Sitiada pelo egoísmo.
E ocupada depois, pelo remorso.
Já nenhuma respiração me entala a cabeça,
entretanto exilada noutros fogos.
Chove, e eu também não sei porque é que as sombras não têm cor.
A luz afia o gume do teu corpo.
Para que a tatuagem veja os bastidores do desejo.
Adormece nos mapas do lençol.
Para que o sangue sacie a erosão do medo.
Agora - que pouco ou quase nada me sobra de ti,
que o sol não saiba - aterroriza-me o esquecimento.
Como se dentro de mim não houvesse eu.
Por vezes ainda me apanho a soletrar o anonimato.
A escutar o vento nas veias.
Se não mentisse, diria que me sobra uma janela e a água

Tanto quanto me cola a voz à tua pele,
assim se encantam os cheiros.
Se fustiga o vento na penumbra úmida onde se recorta a neblina,
Tudo já foi dito e redito, para que o corpo não sature mais a vigilância.
Quando Setembro se faz ao mar,
a água trepa pela labareda plúmbea.
O barro aquece as mãos,
e o olhar esfola o sarro da memória.
Na poalha dos crimes acordados,
boceja um coração atônito.
Ainda fará sentido projetar-me
sobre as arqueologias da ternura?

quarta-feira, 23 de julho de 2008

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Para Recitar a duas vozes em duas línguas

Estuans interius
Queimando por dentro
ira vehementi
com ira veemente,
in amaritudine
com amargura
loquor mee menti:
digo a mim mesmo:
factus de materia,
feito de matéria,
cinis elementi
cinza dos elementos,
similis sum folio,
sou como uma folha
de quo ludunt venti.
com a qual brincam os ventos.
2.
Cum sit enim proprium
Pois se é próprio
viro sapienti
do homem sábio
supra petram ponere
construir sobre pedra
sedem fundamenti,
as fundações,
stultus ego comparor
eu, tolo, me comparo
fluvio labenti,
ao rio corrente,
sub eodem tramite
que sob o mesmo curso
nunquam permanenti.
nunca permanece.
3.
Feror ego veluti
Sou levado embora
sine nauta navis,
como um navio sem timoneiro,
ut per vias aeris
assim como pelos caminhos do ar
vaga fertur avis;
um pássaro é levado sem rumo;
non me tenent vincula,
correntes não me seguram,
non me tenet clavis,
chave não me segura,
quero mihi similes
procuro pelos meus semelhantes
et adiungor pravis.
e me junto aos perversos.
4.
Mihi cordis gravitas
O peso do coração
res videtur gravis;
me parece um fardo;
iocis est amabilis
a diversão é prazerosa
dulciorque favis;
e mais doce que um favo de mel;
quicquid Venus imperat,
tudo o que Vênus ordena
labor est suavis,
é trabalho suave,
que nunquam in cordibus
e nunca mora
habitat ignavis.
em corações (ignavis?).
5.
Via lata gradior
Percorro caminhos largos
more iuventutis,
à maneira da juventude,
inplicor et vitiis
Estou metido em vícios
immemor virtutis,
e esquecido da virtude,
voluptatis avidus
ávido pela voluptuosidade
magis quam salutis,
mais do que pela saúde,
mortuus in anima
morto na alma,
curam gero cutis.
cuido do meu corpo.

Contribuição de Otto Eduardo Gonçalves, que nos envia este belo poema de um monge musicado por Carl Orff na obra Carmina Burana.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

O QUE HÁ DE BELO NA ARTE SURREALISTA DE J. NUNES

Olá Isabel!!!Em anexo obra de J.Nunes.

O artista indaialense J. Nunes está expondo suas telas surrealistas no Grão Espaço, na Casa do Poeta Lindolfo Bell, e podem ser apreciadas em horário comercial de segunda a sexta, onde os timboenses terão a rara oportunidade de apreciar uma exposição de rara beleza.
Os pintores surrealistas exploram através de sua arte o inconsciente e as imagens que não são controladas pela razão. Nos pequenos ou grandes espaços de suas telas, um pincelar nimucioso, associações irreais, bizarras e provocativas. J. Nunes pertence ao grupo seleto dos artistas surrealistas que tem em sua linguagem criativa o rompimento com as noções tradicionais da perspectiva e da proporcionalidade resultando num conjunto de imagens estranhas e fora da realidade.
Mas o que esse talentoso artista, professor da Fundação Indaialense de Cultura, apresenta nessa exposição? Eu diria que não apenas arte, mas sonhos, momentos, instantes congelados de uma beleza que explode em cores vibrantes. A arte surrealista é feita de pequenos e deliciosos detalhes, de uma viagem imaginaria e altamente criativa que captura os olhares dos expectadores, onde num ou outro detalhe, recortes do misterioso inconsciente de cada um de nós se revela.
Não há como desviar o olhar da rosa enquanto é duplamente contemplada, tanto pelo observador fora da tela, quanto pela bela jovem que com gestos enigmáticos a observa dentro da tela sem revelar os sentimentos. Nesse duplo encanto uma mão invisível parece querer tirar a tela de uma moldura que flutua num mar azul, tudo isso apoiado nas rústicas paredes de madeira caiada do Grão Espaço.
É ver para crer que nesse mundo das artes onde fomos invadidos pela chamada arte contemporânea, onde a arte é feita para chocar e não para elevar o espírito que ainda possamos nos deliciar com a mais pura beleza de uma obra de arte em tela.
Isabel Mir
Artista Plástica
Ms Educação e Cultura

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Um critica em bom tempo da exposição “AUTO RETRATO” em comemoração aos 22 anos da BLUAP.

Um grupo de artistas revela na exposição Auto-retrato o que ainda está em segredo.
São auto-retratos de mulheres, rostos, cortes, gestos. Auto-retrato do olhar masculino frontal, penetrante ou enigmático.
Auto-retratos não deles ou delas mas apenas da cor, forma ou simbolismos do que imaginam ser.
Auto-retratos das máscaras belas ou introspectivas que usamos todos os dias. Auto-retratos de momentos vividos de desejos contidos de ilusões e farsas teatrais.
Auto-retrato da força e da fragilidade cristalina escondida sob a cor das máscaras. Todos os olhares se perfilam, se observam, se desdenham, se reconhecem, se amam.
Nenhum auto-retrato é suntuoso, querem apenas parecer simples, coisa de mortais, como se o auto-retrato fosse apenas um momento passado e necessariamente revelado de uns aos outros

Todos fazem um jogo de esconde-esconde. Onde a cor é subtraída aparece a forma. Onde o olhar se revela a intenção se esconde. Onde o simbolismo se expressa se esconde a razão. Onde tudo é escondido o nome é revelado.

Porque não apenas a foto 3x4? Porque o jogo do auto-retrato?

Porque do que vejo alem dos auto-retratos, revelo apenas o que já não é segredo.
Isabel Mir
junho/2008

A ARTE DE FABIANA LOOS

Sou apenas uma observadora diante da arte de Fabiana Loos, onde percebo uma peculiaridade artística interessantíssima: sobre como a sua obra de arte se comporta ante o que cria ou é criada e ainda revelada em seus símbolos, recursos, formas e volumes, que nos desafiam a compreender, discernir, sobre os segredos escondidos nas entrelinhas, nas formas plásticas, no gesto do pincel sobre a tela. As cores absorvem, apreendem, um conhecimento que parece incompreensível para as palavras, mas simples e sincero para o silêncio contemplativo.

É dessa peculiaridade que falo, quando como observadora diante da obra, posso desligar-me dos processos mais profundos da cognição. Não há necessidade de buscas racionais explicativas, apenas o sentir dos significados, que não precisam ser perscrutados nas telas de Fabiana Loos, eles estão lá, claros e fascinantes.

Já ao primeiro olhar, os significados saltam do fundo original em toda sua beleza poetizada pela artista. É dessa peculiaridade que me refiro, a da sinceridade na simbiose entre as linhas em contraponto às formas coloridas. Do gesto fincado nas pinceladas, desenvolvendo um alucinante vocabulário plástico que não pode ser desassociado da sua criadora ao pintar telas de enormes dimensões obtendo uma fascinante combinação abstrata.

Sou apenas uma observadora de Fabiana Loos: Ela, uma artista, um lugar, uma linguagem, uma abstração poética da forma e da cor.

Isabel Mir
Maio/2008

terça-feira, 3 de junho de 2008

A "Arte Resistência" fazendo escola

Publicado originalmente no blog www.bookofhours.blogspot.com

Receita de bolo para o artista contemporâneo iniciante. Servida em qualquer galeria, museu ou salão do eixo Rio e São Paulo, ou em qualquer outro lugar do mundo.

1. Quanto pior, melhor
Saber desenhar e fotografar é coisa dos caretas puristas. Bom mesmo é aquele desenho infantil feito no guardanapo sujo da rodoviária e a fotografia que você tratou no photoshop pra ficar ruim de propósito. Sem falar no vídeo sem foco e imagem tremida para realmente dar aquele ar de "espontaneidade".

2. Quando eu pintava...
Jovens artistas contemporâneos em início de carreira afirmando a sua "larga" experiência na arte com declarações do tipo "quando eu pintava". Só pra dizer que romperam ou estão se lixando com qualquer tradição na arte e agora são subversivos, revolucionários e experimentais.

3. Meu corpo é a minha tela
Em 2 de 10 trabalhos de arte contemporânea, sempre tem alguém que desenha ou corta o próprio corpo e se fotografa ou se filma fazendo isso.

4. Eu me filmo, eu me filmo, eu me filmo, eu me....
Já vi vídeo de gente arrumando a casa, gente se auto-flagelando, gente descascando cebola, gente andando na praia segurando um livro de gelo se derretendo. Dão bons casos de estudo de comportamento obsessivo-compulsivo para um psiquiatra.

5. A Negação da ausência do vazio
Fazer vídeo, instalação, ou fotografia sobre o nada. Nem Sartre aguentaria.

6. Apropriação da fotografia alheia
Sem querer ou saber fotografar, artistas de apropriam de fotos de outrem e as exibem como evidência de um ato cleptomaníaco.

7. Usar e transformar objetos cotidianos
Warhol fez, Lichstenstein fez, e até o cara que faz esculturas com latinhas de coca-cola na feira de São Cristovão fez. Hoje, constitui um verdadeiro marco de originalidade nas artes, e ainda empregam o termo "ready-made" para descrever a obra.

8. A pegadinha urbana
Plantar uma sombrinha amarela no centro da cidade e filmar a reação dos transeuntes ao avistar um objeto tão "estranho" num espaço tão comum é um exemplo dessa vertente. Até o Faustão acha chato.

9. Plagiar Hélio Oiticica
Usar palavras inventadas por HO como bólide, penetrável e parangolé para descrever o próprio trabalho. Criar instalações como labirintos. Usar a estética da favela sem nunca ter pisado numa.

10. Performance
Fora a maioria das companhias de dança contemporânea, um par de moças que se enfiam em casulos no topo de prédios, e uma outra moça que se fotografa em espaços inusitados vestindo roupas incríveis que ela mesma confecciona, toda e qualquer performance feita por um artista jovem é uma pagação de mico.

11. Usar palavras e textos dentro da obra de arte
Artista quando escreve só fala besteira. E ninguém tem paciência de ficar lendo textos críticos e pretensiosos quando ali esperam ver algo de visual. Uso de textos para explicar a obra.

12. Papo-cabeça
Falar usando termos acadêmicos e ininteligíveis sobre qualquer assunto. Uso excessivo de expressões inócuas tiradas de algum texto filosófico francês como "questionamento do meio", "desconstrução do elemento pictórico" e "poética da metáfora da obra".

domingo, 11 de maio de 2008

GUERRA CIVIL BRASILEIRA

O que há em comum entre o Luis ir, o Antonio Mir e a Isabel Mir?
Somos espanhois, amamos o Brasil incondicionalmente, somos estritores, poetas, historiadores, artistas plásticos, e não cansamos nunca de dizer que o Brasil pode ser o país do presente, basta para isso que o Brasil seja visto como ele realmente é, e não como a mídia brasileira insiste em mostra-lo, um Brasil de cerveja, carnaval e mulatas. Um soco de realidade está no livro escrito por meu irmão Luis Mir.
Entrevista: Luís Mir
'Trégua para repartir o bolo'

O historiador Luís Mir sonha com o dia em que colocará um manto negro sobre a estátua do Cristo Redentor, localizada no alto do Morro do Corcovado. Para ele, o ato seria o melhor símbolo para demonstrar o luto de um Estado em que quase 5 mil pessoas foram assassinadas este ano, de acordo com os números oficiais da Secretaria de Segurança Pública. Além disso, mais de 55 mil pessoas sofreram lesões corporais dolosas, ou seja, vítimas de uma violência, que ele considera de guerra. Enquanto o desejo de cobrir o Cristo não acontece, esse catarinense, de 48 anos, acaba de concluir uma pesquisa de cinco anos que deu origem ao livro Guerra Civil - Estado e Trauma, da Geração Editorial. O calhamaço de quase mil páginas mostra que o país vive um conflito civil há uma década e que só conseguirá vencê-lo se for proposta uma “trégua para repartir o bolo” . “Nos últimos 50 anos, a elite concentrou excessivamente a riqueza. É preciso inserir essa população social e economicamente”, defende. De sua casa em São Paulo, ele conversou, por telefone, com o Jornal do Brasil sobre esse confronto de quadrilhas no Rio. Para ele, os tiroteios entre traficantes é resultado de um processo que teve início há 40 anos com a transferência da capital federal para Brasília. “O processo de gestação desse ovo da serpente começou há quatro décadas. A cidade não foi preparada para isso. Foi dormir capital e acordou balneário. Brasília deveria receber a capital lentamente, em 20 ou 30 anos”. Nesta entrevista, ele não hesita em se mostrar desesperançoso.

A semana foi marcada por conflitos em vários pontos do Rio. Como resolvê-los?

– A solução é fatiar o bolo. Vivemos uma hecatombe humana e precisamos mudar isso. O Estado brasileiro é muito rico e poderia patrocinar uma redistribuição de renda. É preciso inserir social e economicamente esse povo. Você não vê o governo federal se reunindo para discutir as mortes dessas pessoas. O programa do desarmamento é importante, mas não é o suficiente. Não temos um Estado de Justiça. Vivemos uma guerra civil.

No caso do Rio, por que o problema se arrasta ao longo dos últimos anos?

– Esse ovo da serpente, que é a violência no Rio, foi gestado há 40 anos, na transferência da capital federal para Brasília. Por favor, que fique claro que não tenho nada contra Brasília, onde um filho meu nasceu, mas o Rio não foi preparado para deixar de ser capital da República. Imagine como fica uma cidade que de um dia para o outro perde 1 milhão de empregos. Foi isso que aconteceu.

- Mas, já não houve tempo para que ela se recuperasse?

– Como? O que fizeram com o Rio é o equivalente a uma Hiroshima econômica e social. Induziram a cidade ao suicídio. Em um ano e 11 meses, o presidente Juscelino (Kubitschek) resolveu levar a capital para o interior do país. O Rio dormiu capital e acordou balneário sem qualquer transição para isso. Conto um exemplo: quando o muro de Berlim caiu e decidiram que Berlim seria a capital da Alemanha unificada, a transição para que Bonn deixasse de ser capital da então Alemanha Ocidental durou 10 anos. Serviços e funcionários foram sendo transferidos aos poucos para Berlim. Não foi uma mudança radical. Brasília deveria se tornar a capital plena em 20 ou 30 anos, e não da forma como foi feito.

– Para resolver o problema seria necessária a mobilização dos governos municipal, estadual e federal?

– As pessoas esquecem que o Rio tem características nacionais. Quando o Rio perde, todos perdem neste país. Só para lembrar, o Estado tem o segundo PIB do Brasil. Mas, parece que nada é feito. A geometria urbana do Rio criou áreas segregadas e definidas, bem distantes do núcleo econômico. É infame, indigno. Imagine se não tivesse sido descoberto o petróleo. Como estaria a situação do Estado? Quando passo pelos edifícios históricos do Centro do Rio como o Amarelinho, o Teatro Municipal ou a Biblioteca Nacional tenho vontade de chorar. Essa cidade não merece o que fazem com ela.
– Para isso seria preciso uma reforma em toda polícia. No momento, a estrutura é imóvel, paramilitar. Veja nosso caso. Quando um país, como o nosso, passa por um processo de redemocratização é preciso dissolver todos os corpos repressivos. Ou seja, é preciso se criar uma nova polícia, o que não foi feito. Na Espanha, quando acabou a ditadura do general (Francisco) Franco, a polícia foi dissolvida e para marcar essa nova fase, os uniformes deixaram de ser cinzas para se tornarem azuis, simbolizando assim a mudança. Isso não aconteceu aqui. Temos uma polícia militar que ocupa morros ou realiza operações. É a maior demonstração de que estamos em guerra.

Isso explicaria a violência que seria praticada pela polícia nessas ações em morros e favelas?
– É um dos motivos. Existem outros. Temos um problema que é a morte praticada pelas mãos do Estado. Uma coisa tem que ficar bem clara: o Estado não pode matar. Quando ele faz isso, ele institucionaliza a violência, a tortura. Nenhum agente do Estado tortura em praça pública ou na Vieira Souto. Ela acontece em locais ermos ou em quartéis da polícia. A força só pode ser utilizada em último caso. A partir do momento em que o Estado quebra a regra, ele perde o direito. Isso é guerra civil.

– A prevenção seria a melhor saída para que os confrontos fossem evitados?

– Não há dúvida. Tenho uma questão: por que os policiais são vistos nos pontos turísticos e não nas favelas? Aliás, eles só vão até elas quando ocorrem confrontos entre grupos armados. Mas não deveriam estar ali antes? Além disso, o Estado precisa acabar com essa prática de eleger o inimigo público número 1, o mais procurado. O Elias Pereira da Silva (Elias Maluco, acusado de matar o jornalista Tim Lopes) ocupou esse posto durante um bom tempo. E qual foi a solução para o problema? O que se vive no Rio é a violência praticada por vendedores de drogas que disputam mercados. Os líderes do tráfico de drogas e armas não estão nas favelas.

– O crime nos morros não é organizado?

– Se fosse, eles não estariam resolvendo as desavenças à bala. Ali, nos morros, acontece uma disputa comercial, entre os distribuidores da droga, que integram a indústria do tráfico, mas estão longe de serem os cabeças. Imagine, por exemplo, se 50 mil pessoas, que vivem direta ou indiretamente, no Rio, do tráfico? O que se faz com elas se a polícia “quebra” o negócio? Os governos precisam fazer alguma coisa. O bolo tem que ser repartido.

– Enquanto isso não acontecer, a violência só tende a crescer?

– Com certeza. As pessoas não perceberam que o sistema de saúde está em colapso. Imagine que para cada vítima de violência cerca de 200 pessoas entre parentes e amigos sofrem seqüelas. Um paciente grave pode chegar a custar R$ 1 milhão aos cofres públicos e privados se contarmos da internação até o tratamento pós-operatório.O trauma nunca se esgota. É um calvário que, por enquanto, não tem solução.

– A solução do problema passa também pela participação social?

– Nos últimos 50 anos, a elite brasileira se fechou e concentrou muita riqueza, o que impediu o crescimento desse país. Nos próximos 20, 30 anos, somos um país inviabilizado. O que percebo é que enquanto essa sociedade estiver blindada, achando que está protegida da violência em seus carros especiais ou casas com grades, ela permanecerá em silêncio. Vejo o Rio de luto. O Cristo Redentor deveria ser coberto por um manto negro para simbolizar o momento por que passa a cidade, ou melhor, esse país. (Marco Antônio Martins).

Guerra Civil: Estado e Trauma
LUIS MIR
Neste livro, Luís Mir diz que nosso país está vivendo uma verdadeira guerra civil, em que as pessoas se matam entre elas ou são fuziladas pela polícia, principalmente a tiros, e nas favelas. Ou seja: as vítimas desta guerra são os pobres, que vivem em permanente estado de tensão e terror. As mortes chegam a 150 mil por ano e custam, para o Estado, metade do que o país gasta com saúde. Não existe no mercado nenhum outro livro igual a este, que é absolutamente inédito e original. Guerra Civil: Estado e Trauma, com quase mil páginas, estudo sobre a guerra civil brasileira e suas vítimas, desnuda com precisão documental, propriedade moral e serenidade investigatória essa verdadeira tragédia nacional, atordoante e aterradora.

O QUE A IMPRENSA FALA SOBRE MINHA EXPOSIÇÃO EM FLORIANÓPOLIS


Artista espanhola expõe suas esculturas na Livrarias Catarinense em Florianópolis

A Livrarias Catarinense apresenta de 01 a 27 de maio em seu Espaço Cultural da Megastore, no centro de Florianópolis, a exposição Aço e Forma da artista plástica e poeta Isabel Mir.Isabel é espanhola, mas já vive no Brasil há muito tempo e a dez dedica-se a arte. Suas oito esculturas expostas na Livrarias Catarinense são feitas a partir de aço com solda a arco, para a modelagem das chapas lisas. Desde sua infância a artista demonstrou interesse por arte e cultura. “A arte sempre fez parte da minha família, meu irmão é pintor, mas tive um tempo dedicado à educação.
Fui professora da Furb onde lecionava disciplinas ligadas à arte e cultura brasileira”, declarou Isabel. Já realizou mais de 30 exposições coletivas e individuais.Isabel já realizou diversos cursos de aperfeiçoamento. É mestre em Educação e Cultura, estuda periodicamente com um grupo através de oficinas e cursos de diferentes linguagens da arte. “No mundo que vivemos, onde a tecnologia nos deixa sempre um passo atrás, não há como viver sem aprender algo novo a cada dia”, completou.As inspirações da artista para produção de suas esculturas são as pessoas comuns, presentes no cotidiano de todos, tendo como pano de fundo as paisagens de Santa Catarina. “Todo artista é um observador inquieto do seu entorno, que usa códigos para se comunicar. Eu sou essa inquietude. preciso do desafio, do inesperado, e até da decepção para a criação”, completou.
Quando questionada sobre qual a mensagem que deseja passar ao público com suas obras Isabel é direta: “Na coleção Aço e Forma inspirada nos peixes e matas ciliares do Rio itajaí, gostaria que o expectador também visse a dor e o luto vestido das esculturas”.
Quando questionada sobre qual sua compreensão de ser artista, isabel é direta: “Ser artista não é destruição e construção, mas adaptação e transformação, é caminhar pelos desejos e ser levada pelas circunstancias”.A exposição permanece aberta ao público até o dia 27 de maio. De segunda a sexta-feira, o horário de visitação é das 9h às 20h. Aos sábados, das 9h às 16h. Entrada gratuita.

sexta-feira, 2 de maio de 2008

ANDANTES E ANDARILHOS



Finalmente todos foram embora
Seguiram juntos caminhos separados
Uns porque tinham
Outros porque desdenhavam
Dos pés sem calçados
Dos calçados sem donos
Da pele humana sem adorno
Finalmente todos voltaram
Calados e cabisbaixos
Andantes sem encontrar o caminho
Andarilhos sem um caminho para encontrar
Uns porque foram muito longe
Outros nem saíram do lugar
Dos pés cansados e feridos
De tanto procurar os caminhos
Aos pés sossegados de tanto esperar
Todos ficaram para sempre
Andantes e andarilhos
Juntos na mesma encruzilhada
Do mesmo caminho
Uns porque tinham esperança
De encontrar um calçado
Outros porque nunca tinham andado
Finalmente todos se olharam
Andantes e andarilhos
Uns porque não queriam ver os outros
Outros porque se escondiam
E de tanto fechar os olhos
Uns e outros se tocaram
Na escuridão de seus medos
E sem saber os andantes
Levaram os andarilhos
Juntos a percorrer o mesmo caminho
Uns porque não tinham pés
Outros porque tinham calçados
Caminharam longos tempos lado a lado
Corpos juntos sonhos colados
Andantes e andarilhos
As duas faces do mesmo homem
Um dia sem pés
Outro dia calçado

Isabel Mir
Abril 2008

segunda-feira, 28 de abril de 2008

ARTE-EDUCAÇÃO


Arte-educaçãoApril 28th, 2008

por Fabiana Langaro Loos

Nos dias 17 e 18 de abril de 2008, a Fundação Cultural de Balneário Camboriú realizou, no Hotel D´Sintra, o “III Seminário de Balneário Camboriú: Arte-educação em Perspectiva”, que contou com diversas palestrantes de Santa Catarina, entre mestres e doutoras com formação em arte-educação, muitas delas oriundas de Itajaí, as quais podemos destacar Ane Fernandes (artes visuais), Mônica Uriarte (música), Márcia D´Avilla (artes visuais), Silvana Rocha (artes visuais) e Valéria Maria de Oliveira (teatro). Ainda estavam presentes, Drª Sandra Ramalho e Fabíola Costa, de Florianópolis, a artista plástica Isabel Mir, de Indaial, Carla Carvalho, de Blumenau, Drª Nadja de Carvalho Llamas, Drª Sílvia Sell Duarte e Eliana Stamm, de Joinville e a presidente da Fundação Cultural de Balneário Camboriú, a arte-educadora e ceramista Olinda Schauffert.


O intuito do seminário foi discutir questões ligadas ao ensino da arte nas escolas das redes públicas e privadas de ensino, e ressaltar a importância da educação em arte, a fim de propiciar o desenvolvimento do pensamento artístico e da percepção estética, que caracterizam um modo próprio de ordenar e dar sentido à formação do aluno e, de uma forma mais abrangente, do ser humano. O seminário foi gratuito, teve uma intensa programação de dois dias, nos períodos matutino e vespertino, e contou com a participação de mais de 300 professores, vindos de diversas cidades de Santa Catarina, como Blumenau, Itajaí, Balneário Camboriú, Florianópolis, Timbó, Indaial, Joinville, Penha, Navegantes, entre outras.


As palestras foram de significativa importância para mostrar ao professor de artes a necessidade de sua presença nos aspectos culturais da cidade, participando ativamente de exposições de artes, concertos musicais, teatro, artesanato e saraus literários. Enfim, de nada adianta o professor ensinar arte em sala de aula e, na prática, estar ausente da programação cultural do local onde reside, ou seja, não vivenciar a arte. Segundo a arte-educadora e artista plástica Isabel Mir, “cabe ao educador perpetuar os dogmas da arte contemporânea, ou questioná-los, inovando na missão de entender, apreciar e fazer arte”. Toda linguagem artística é uma maneira particular e única do homem pensar e questionar sua presença no mundo, pois a arte ajuda a compreender nosso tempo em uma perspectiva sócio-cultural.


Em nosso país há uma grande diversidade cultural. É importante acreditar nas diferenças, na liberdade de expressão, na produtividade e na criatividade de nossos artistas. Mais importante ainda, é formar cidadãos com vontade de participar de atividades culturais e formar apreciadores da arte, conseqüentemente, seres com uma visão crítica do mundo. Cada um de nós ouve, observa e entende conforme sua bagagem, não é possível enxergar com os olhos dos outros. É preciso respeitar o contexto de cada indivíduo. A arte é uma área específica de conhecimento, da mesma forma que todas as outras disciplinas. Assim, arte é capaz de propiciar conhecimento, lazer, trabalho e idéias, oferecendo a todos uma melhor consciência do mundo.


Portanto, professor, aluno, cidadão, viva a arte, faça arte, integre-se à arte.

VIOLA CAIPIRA

A VIOLA CAIPIRA
Isabel Mir Brandt[1]


O folclore, ciência considerada indispensável para o conhecimento social e psicológico de um povo. e é encontrado na literatura sob a forma de poemas, lendas, contos, provérbios e canções, assim como nos costumes tradicionais como danças, jogos, crendices e superstições, bem como, nas artes e nas mais diversas manifestações da atividade humana. Pode-se dizer que o folclore traduz ao vivo a alma de um povo, pois é específico e genuíno.

Apesar do estudo do folclore ser relativamente recente, pois se originou há cento e cinqüenta e dois anos, o folclore, em si, é a cultura mais antiga da humanidade, mais velha do que a história, pois mesmo antes que a ciência existisse, já os mitos, as lendas e o artesanato eram transmitidos através das gerações desde os remotos tempos pré-históricos, principalmente por via oral. O folclore, apear de não percebermos, acompanha a nossa existência e tem grande influência na nossa maneira de pensar, sentir e agir.

Entre as inúmeras e valiosas manifestações do folclore brasileiro, vamos encontrar a viola caipira que é um instrumento de corda trazido pelo colonizador português, ao som da qual cantava para curtir a saudade da pátria distante. Tem cinco ou seis cordas duplas, metálicas: as duas primas e segundas eram de aço, a terceira era feita de metal amarelo (latão), enquanto o bordão de ré era de aço, o de lá e o mi, de latão. Desde a introdução da viola pelos portugueses durante o processo de colonização dos Brasil, até a difusão pelos mais remotos lugares durante a expansão bandeirante, a viola sempre fez parte da cultura musical brasileira, onde é por excelência um instrumento musical do meio rural.

Um dos maiores estudiosos do folclore brasileiro foi o Professor Alceu Maynard de Araújo, que nos deixou como legado entre tantos outros, o estudo sobre a viola caipira. Trata-se de um dos mais completos registros históricos feitos no Brasil sobre o tema, e foram publicados na Revista Sertaneja de números 4, 5, 6, 7, 8, 9, 13 e 14, entre julho de 1958 a maio de 1959. São desses estudos que as principais características da viola caipira e seus tocadores ficam registrados, dessa forma, os grupos de viola caipira que se inserem dentro dos conceitos do folclore brasileiro devem manter certas características como a utilização do ponteio de cordas soltas, o uso de palheta ou dedeira e chocalhos. Também o violeiro deve vestir-se com chapéu de palha, camisa, calça e botinas.

Araújo nos conta que com o desenvolvimento das cidades e em conseqüência o esvaziamento populacional do campo onde a viola tinha reinado até o fim do século XIX, ocorre uma valorização dos costumes urbanos e uma depreciação de tudo que era oriundo do campo. A viola passa a fazer parte não mais do cancioneiro cotidiano das cidades onde o violão assume o lugar de importância. A viola passa a fazer parte do folclore brasileiro através do folclorista Cornélio Pires que em 1910 organizou um festival de Viola Caipira em São Paulo no Mackenzie College, com o intuito de manter viva essa tradição musical.

Atualmente a viola caipira voltou ao seu lugar de importância pela integração cultural realizada em todo o território brasileiro através dos canais de rádio e televisão e de uma programação cultural voltada a valorização e integração do folclore e costumes do homem do campo nas cidades, impulsionada e patrocinada pela agroindústria. Aos poucos a viola caipira sai das festas familiares nas fazendas e sítios do interior, e seus violeiros aventuram seus cantos e duelos nas praças, feiras e rodeios do imenso Brasil, afirmando a viola caipira e seu cancioneiro como uma das mais fortes e antigas manifestações da cultura brasileira.

Biografia: ALCEU MAYNARD ARAÚJO nasceu no dia 21 de dezembro de 1913, na cidade de Piracicaba, SP. Formou-se professor em 1930 e veio para São Paulo, ingressando no Curso Colegial e Científico do Colégio Ipiranga. Em 1944 bacharelou-se na Escola de Sociologia e Política de São Paulo, depois do que exerceu diversas funções e pertenceu a diversas entidades. Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo e da Sociedade Brasileira de Folclore. Divulgou o Brasil através de filmes de sua autoria, no programa da TV - PRF-3, "Veja o Brasil". Na área do Folclore publicou: Cururu (1948), Danças e ritos populares de Taubaté (1948), Folia de Reis de Cunha (1949), Rondas infantis de Cananéia (1952), Literatura de cordel (1955), Ciclo agrícola, calendário religioso e magias ligadas às plantações (1957), Poranduba paulista (1958), Folclore do mar (1958), Medicina rústica (1961), Novo dicionário brasileiro - verbetes de folclore (1962), Folclore nacional (1964), Pentateuco nordestino (1971), além de muitos ensaios e artigos na imprensa brasileira e revistas especializadas. Falecido em 1974.

Isabel Mir
Ms Educação e Cultura
SER ESCRAVO É BOM!
Minha vida politicamente incorreta”

Sabe aquele dia que você tem vontade de voltar ao passado? Pois é... Acordei com vontade de ser escrava no tempo do Brasil Colonial.

Porque devia ser bom trabalhar de sol a sol, o que hoje não faço já que a tecnologia da iluminação artificial transformou minha noite em dia, hoje trabalho de dia-a-dia.

No tempo da escravidão eu iria a pé e de graça para o trabalho cantando com meus companheiros, hoje para andar sem ser atropelado, assaltado ou cair em algum buraco das calçadas, é preciso pagar muitos impostos e uma “tal” de academia para ficar em forma.

No tempo da escravidão tinha o capataz, que cuidava da produção, mas também protegia os escravos de possíveis ataques dos bandidos das redondezas. Hoje temos a polícia, a justiça, as leis, e a turma dos direitos humanos que protegem os bandidos, daí o grande impasse da atualidade “ser ou não ser” bandido.

No tempo da escravidão, escravo mal alimentado ou doente era prejuízo na certa, então era preciso alimentá-los e manter, médico, curandeiro, benzedeira, além de uma farta farmácia de remédios caseiros a base ervas naturais para qualquer eventualidade. Hoje temos os hospitais que se transformaram em centros mortuários, já que acreditamos que ninguém morre, porque está proibido morrer tranquilamente em casa.

No tempo da escravidão os filhos bastardos iam estudar na Europa, tornavam-se os doutores, em direito e em medicina, e até lutavam pela liberdade dos seus parentes. Hoje os filhos bastardos lotam os laboratórios para análise de paternidade, tornam-se bandidos e matam os seus pais.

No tempo da escravidão não tinha aposentadoria, o escravo nascia e morria na propriedade do seu senhor, não se preocupava com a casa própria, aluguel, impostos, o fazendeiro que se virasse com essas coisas chatas. Além do mais o trabalho era classificado por gênero, faixa etária e força física. Hoje os jovens são proibidos de trabalhar, mas não de “bandidar”.

No tempo da escravidão, se o escravo roubava, estuprava, assassinava, ou fazia outros tipos de delitos como transar e engravidar a filha do senhor ia para o tronco, levava tantas e outras chibatadas, de acordo com a gravidade do delito não importava a idade do escravo. Hoje um bandido, bem barbudo, malhado, com 1,80m de altura e 86kg, mas que ainda tem 17 anos é considerado uma pobre criança que deve ser protegida pela lei e pelos direitos humanos.

Hoje você consegue um trabalho desumano, trabalhando na boca do forno, num ambiente de 40º, com um salário mínimo que só permite a vida vegetativa, e ainda está com medo de ser despedido.

Dá ou não dá vontade de ser escravo? Ou melhor dizendo... Senhor de Escravos.

Isabel Mir
www.isabelmir.com.br

quarta-feira, 23 de abril de 2008

CUBA LIVRE - era uma bebida dos anos 70

“Minha vida politicamente incorreta”

Isabel Mir

Nestes tempos conturbados, dominados por notícias das guerras de aqui e acolá, resolvi contar o que andei aprontando não faz muito tempo na ilha de Fidel.

É que foi pura coincidência eu estar em Havana no mesmo dia em que o ator americano Kevin Costner, estava lançando o seu filme sobre os mísseis russos da Baia dos Porcos, que os cubanos não conseguiram montar, ou já os teriam disparado contra os EUA e eu não estaria neste mundo para contar esta história, dentro de outras tantas inacreditáveis para os fãs Del Comandante Fidel. Bastou um único dia na paradisíaca ilha de Fidel para meu sonho do perfeito mundo socialista desmoronar.

O Hotel onde me hospedei juntamente com meu marido, ficava a duas quadras da embaixada soviética, que é a mais espetacular fortaleza da engenharia de guerra que eu já vi, nem mesmo nos efeitos especiais dos filmes americanos, que sequer chegam perto da realidade, que pode ser vista, mas não pode ser fotografada, nem filmada, nem com uma câmara oculta, pois quando tentei sair de Cuba com algumas imagens, tive todos meus pertences saqueados, pelo pessoal da camisa vermelha de Chaves, já em terras venezuelanas, onde estranhamente minha bagagem extraviada foi parar.

Mas voltemos a Havana, ao Hotel Nacional, ao Fidel e ao Kevin.

Como os cubanos, cidadãos normais, jamais sabem o que está acontecendo nas mansões da elite do partido cubano, muito menos o que acontece nos luxuosos hotéis dos quais estão proibidos de se aproximar, sob a ameaça de serem presos pois podem estar conspirando contra Fidel com algum estrangeiro, resolvi dar uma oportunidade a um casal de cubanos de pelo menos uma só noite se sentirem livres para realmente fazerem aquilo que Fidel tanto teme, ver de perto a riqueza e opulência da elite cubana.

O plano iniciou com um convite para que um casal de cubanos, ele um engenheiro e ela uma economista que nunca estudou sobre globalização e muito menos sobre capitalismo, fossem nossos guias turísticos pela velha Havana, e entre uma e outra foto, apresentamos nosso plano, que foi aceito de imediato, nem que isso lhes custassem a vida.

No dia seguinte conseguimos com que o casal fosse até nosso Hotel, onde a mulher deveria se passar por prostituta para poder subir até nosso quarto, o que é normal e aceito, pois a prostituição em Cuba também é estatal. No quarto a economista pela primeira vez em sua vida tomou um banho de água quente, sem falar no espanto que lhe causou quantidade e qualidade dos perfumes, cremes, maquiagem, que estavam a disposição dos hospedes como cortesia do hotel e começou a perguntar como essas coisas entravam em Cuba e eram doadas aos estrangeiros.

Quando ela saiu do quarto estava irreconhecível, era uma perfeita turista, maquiada, cheia de bijuterias, com roupa de moda, óculos de sol, disfarçada o suficiente, para sair do hotel sem ser reconhecida. Quanto ao seu companheiro, o engenheiro, uma camisa pólo da Lacoste foi o suficiente para o disfarce, já que sua aparência física tinha sido herdada do seu avô americano.
E lá fomos os dois casais com o carro japonês que alugamos, rumo ao Hotel Nacional.

Assim que chegamos já no estacionamento nossos dois acompanhantes ficaram por alguns segundos em estado de choque, imóveis, pareciam não acreditar no que estavam vendo, depois começaram a falar baixinho um com o outro... Pensávamos que tinham desistido do plano, mas logo o engenheiro quis saber se era verdade uma história que ele tinha ouvido quando criança antes de seu avô morrer na prisão. Referiu-se a uma rosa-dos-ventos que deveria estar nesse hotel.

Ao ser informado que era verdade, e que podíamos levá-los até a sua localização nos jardins do hotel, o casal novamente se animou e lá fomos nós... Bem só até o salão onde estavam sendo preparadas as mesas do banquete que seria servido logo após a exibição do filme.

Não havia forma de fazermos os dois dar mais um passo, os olhos fixos na prataria e na cristaleria das mesas, os arranjos de flores e frutas... Maravilhada ela queria tocar, saber se era de verdade... Falamos que corríamos perigo de vida se eles demonstrassem qualquer sentimento que não fosse o de um turista, e logo os dois se refizeram das emoções e conseguimos atravessar os vários salões da festa, nos abastecendo com tacas de um delicioso champanhe que estava sendo servido a vontade e ainda vimos o Kevin Costner esperando pacientemente o Fidel que ainda não tinha chegado para a festa porque estava discursando há mais de 6 horas para os repórteres que cobriam o evento. Procurando evitar conversa e nem dar tempo de que alguém se aproximasse do nosso grupo para não sermos identificados, nos dirigimos até os jardins do Hotel Hacional que deixariam Nabucodonosor morto de inveja, pois com certeza superam os jardins da antiga babilônia. E lá estava a enorme rosa-dos-ventos feita de mosaicos no piso do grande deque projetado sobre o esverdeado mar do caribe, contrastando com as diversas matizes dos mármores do mosaico.

Os dois pediram que esperássemos na parte de cima do deque, e se dirigiram abraços caminhando em direção a ponta mais extrema se ajoelharam e começaram a chorar.
A cena nos deixou novamente em pânico, e nos aproximamos rapidamente para tentar disfarçar e saber o que estava acontecendo. A resposta veio de um gest0o do engenheiro cubano que com a mão tremula e o peito pulsando aos soluços apontou para o mar e disse:
- São 140 km para a vida e a liberdade.

Se o nosso plano era mostrar a rica elite cubana, o deles era pular no mar e nadar até os EUA.
Perdemos a exibição do filme. Ficamos conversando no jardim para que desistissem de pular no mar. Mas pretendíamos ainda aproveitar o banquete, mas novamente ficamos em panico quando o casal nos informou que tinham que voltar para casa, pois se não estivessem no cortiço onde viviam até a meia-noite, a polícia do quarteirão seria acionada, e eles teriam que contar onde estavam, com quem, e o que faziam, e que nós é que iríamos para na cadeia.

Não foi preciso muita conversa, logo entendemos. Difícil foi passar pelo salão do banquete e voltar para o hotel sem jantar e sem uma foto ou autógrafo do Kevin.

Mas o final dessa aventura toda é que o casal com as nossas roupas doadas e passaportes falsos que uma ONG canadense conseguiu para eles, fugiram de Cuba e hoje vivem numa pequena cidade nos arredores de Paris. Só não estão totalmente livres e felizes, porque o castigo para as famílias daqueles que conseguem fugir de Cuba é a total privação dos “benefícios socialistas”, ou seja o vale refeição, escola, saúde e moradia, transformando os pobres parentes em parias da sociedade cubana, o que é uma grande economia para o estado socialista de Fidel, já que milhares de cubanos tem um ou outro parente que fugiu. Mas o lado bom é que os fujões encontraram um jeito de alimentar um mercado negro, administrado pela elite do partido de Fidel, onde a moeda corrente é o dólar que entra aos milhares pelas mãos dos turistas, que entregam para parentes sobreviverem desse mercado negro, e assim escaparem pelo menos de morrer de fome na ilha de Fidel.

Isabel Mir/ janeiro/2008

ARTE RESISTENCIA

ARTE RESISTÊNCIA[

Isabel Mir Brandt

Resumo: Este texto ressalta a preocupação que, como arte-educadora, tem se tornado tema de pesquisa com relação aos desafios e dilemas pessoais que enfrento também no fazer artístico do meu dia-a-dia como artista contemporânea, bem como na avaliação que fazemos do fazer arte na atualidade. Este texto é um relato de experiência a partir das impressões deixadas por um grupo diferenciado de freqüentadores do meu atelier de escultura, os estudantes da rede pública de ensino e seus arte-educadores.

Palavras chaves: arte-educação, arte contemporânea, arte resistência.
Abstract: This text emphasizes the worry I have as an art teacher. It has become a subject of research in relation to the individual challenges and doubts that I face in the artistic work and also part of my daily life as a contemporary artist, as well as the art evaluation of making it nowadays. This text is also a narrative of the experience I had through the impressions left by a distinct group of people that visited my sculpture workshop, the students of the public sector and their art teachers.
Key-words: art teachers, contemporary art, resistance art.

1. Introdução:

Como chegamos até a arte contemporânea:

O início do século 20 trouxe para a arte a abstração, ou seja, uma representação não-figurativa, na qual o olhar espectador não reconhece de imediato o objeto representado, levando a questionamentos e interpretações. Se o século 19 trouxe respostas práticas por intermédio das grandes invenções e do desenvolvimento da tecnologia, e a busca do homem coletivo integrado na sociedade, o século 20 estabeleceu outros parâmetros. A atenção se volta para dentro do ser humano, com a valorização não mais das grandes causas, mas do individual, do micro ser dividido entre o coletivo e o individual, entre o mundo público vigiado pelas câmeras e o privado dos sentimentos e ações inconfessáveis.

Da mesma forma, o cubismo de Picasso e a arte concreta, expressão cunhada pelo holandês Theo van Doesburg (1883-1931) em 1918, vão dar o caminho que a arte seguiria até a metade do século 20, ou seja, o de sua rotulação. Na necessidade de buscar cada vez mais a individualização, a arte se fragmenta em tendências. Ferreira Gullar, em 1959, publica o manifesto no qual ressalta as diferenças entre os concretistas e os neoconcretistas.

Na metade do século 20, outra questão: a pop art. O que Andy Warhol (1928-1987) propôs é que o artista antecede a própria obra. É a assinatura que leva o observador a reconhecer obra. Seria o nascimento da grife na arte. O valor não está mais na obra, mas na assinatura. Dos anos 60 para cá, não importa muito o que o artista cria, mas o seu currículo, sua assinatura. Todo tipo de lixo-arte pode ser apresentado nos grandes salões, desde que assinados por um currículo.

2. Sem Fundamentação Teórica:

A Arte na Universidade:

Quando os cursos universitários de arte se popularizam, nasce o movimento conceitual. O artista busca por intermédio do conhecimento dar à sua obra o rótulo da "arte inteligente". Levar objetos do cotidiano transmutados para os grandes salões, deliciar-se com a incompreensão dos observadores é colocar o artista na elite intelectual, dentro da academia, do grupo seleto em que a idéia antecede a obra. São os neofigurativos. Obras como um prato vazio colado numa tela em que o observador reconhece se tratar de um prato, mas que, na verdade da interpretação inteligente de seu criador, é a figuração da fome, deixando realmente o observador com fome de arte.

Da mesma forma em que as exposições comerciais ou salões se multiplicam, o observador, que é constantemente chamado de inculto, vai aos poucos estudando a tal arte conceitual, e se transforma no artista de fundo de quintal, que cola três gravatas numa tela, pinta por cima com uma cor fria e se intitula contemporâneo, cujo conhecimento sobre arte foi recém adquirido num curso. Fala sobre sua própria arte com o linguajar fluente dos críticos ao abordar temas como textura, linhas, profundidade, conceito, figuração etc.

Quando o neofigurativo é apropriado pelos artistas autenticados pelos diplomas da academia, a "arte inteligente" extrapola os ambientes expositivos acadêmicos para se lançar numa outra idéia, a da "instalação". A arte não pode ser mais repetida, comprada, colecionada, ela é efêmera. O observador tem de ir ao encontro dela, correr, ver, posicionar-se diante da obra e registrar a imagem na foto, antes que termine seu tempo. Ao artista criador cabe o registro na mídia, o impacto causado, o estranhamento documentado e adicionado ao currículo.
Algumas tendências da arte contemporânea serão eternizadas apenas pela foto arquivada na seção "Arte" dos arquivos documentais históricos e não mais nos museus, porque é mais barato arquivar uma foto do que manter conservada por anos uma obra de arte nas acervos das instituições.

3. A metodologia anti-científica:

A arte objeto de consumo rápido:

Dessa forma, bem-vindas sejam as "instalações" que podem incluir performance, objeto, vídeo, e principalmente o observador, estabelecendo uma interação entre eles. A inclusão do observador nesse processo é necessária para a dar autenticidade à obra com o intuito de levar as pessoas a tomar consciência do seu espaço, do seu corpo e de sua realidade.

Enfim, a arte do século 20 faz o seu observador passar de inculto a inconsciente de si mesmo e da arte a salvadora do homem. Entra em discussão um novo rótulo: a "arte-terapia", a salvadora de todos os males do novo homem que vão dos físicos até os morais. Proliferam as "escolinhas de arte", de inclusão social.

Essa nova modalidade de incluir e ser incluído cria a "performance", que consiste em transformar o artista em produtor da obra de arte teatral. Tudo é arte, tudo vira arte, tudo pode ser arte ou tudo pode ser incluído, do lixo às paisagens, da música aos gestos, desde que apresentado de forma teatral. E da mesma forma que a foto registra a instalação, o vídeo registra a performance. Nasce o mais recente rótulo da arte contemporânea, a videoarte.

Mas é nos bastidores dos grandes museus e galerias que administradores, financiadores, curadores e críticos compactuam felizes sobre as novas tendências da arte contemporânea. Primeiro porque fazer uma exposição de fotografias é de baixíssimo custo. As fotos chegam via internet e logo são impressas em equipamentos de alta tecnologia a custo mínimo. Os custos da videoarte, já produzida pelo artista, ficam dependendo da disponibilidade ou não do equipamento de projeção. À pintura sobre tela e à escultura, sejam elas deste ou aquele outro rótulo da arte contemporânea, restaram o mais importante item a ser observado nos editais e regulamentos dos espaços expositores: o transporte e seguro das obras, que deve ser única e totalmente responsabilidade do artista.

Assim, para os organizadores e curadores dos salões, uma escultura em aço que necessite de condições especiais de transporte, pelo seu volume e peso, é uma obra menor diante de algum objeto mínimo que chegue pelo correio a custo zero.

4. Descrição e análise do que?

Arte é um registro na mídia:

E quem são esses artistas que conseguem bancar a exposição de obras produzidas com altos custos e que não são vendáveis, apenas de vivência efêmera nos salões? Quem os patrocina? Se essa arte não é feita para o observador transformar-se em possuidor da obra? Se após o encerramento do salão a grande maioria dos trabalhos contemporâneos é abandonada por seus criadores, uma vez que o mais importante é o catálogo que será incluído no currículo? Nem ouso sugerir.

O resultado é que as instituições públicas promotoras de salões, sob a bandeira da arte-inclusão, estão conseguindo criar um novo contingente de excluídos, que pessoalmente rotulei como os "refugiados da arte contemporânea". Eles criaram seus próprios refúgios, sob as mais precárias condições de sobrevivência nos seus ateliês e oficinas.

5. A oralidade:

A arte resistência:

Existe uma arte subterrânea, longe do glamour e dos holofotes da imprensa do espetáculo dos salões, que é gestada entre o criador e o possuidor. Uma arte que silenciosamente se desloca sobre uma malha de entendimento e afeto, onde a grife e o currículo do artista pouco importam. Existe, sim, um mercado de arte nesse campo de refugiados, dos incultos, dos inconscientes, dos excluídos, que os holofotes não focalizam, e dessa escuridão vem a sua própria sobrevivência. Seria necessário criar um novo rótulo para essa arte? Seria arte-resistência? Existir e resistir enquanto for possível até que nos encontrem e destruam.

Em 2007, abri as portas de meu atelier de escultura para um projeto da Fundação Indaialense de Cultura, juntamente com a Secretaria de Educação do município de Indaial/SC, onde os estudantes das escolas públicas, acompanhados de seus professores de artes e literatura, podiam conhecer o ambiente onde o fazer do artista se conjuga com o ato criativo. Em apenas uma semana cerca de trezentos e cinqüenta estudantes buscaram conhecer a arte contemporânea sob a visão do artista que a produz.

As visitas foram organizadas em grupos vinte alunos de cada vez e permaneciam cerca de uma hora no atelier para possibilitar um diálogo entre os estudantes de arte e a artista. Durante as visitas percebemos que os questionamentos mais comuns que os estudantes faziam a maioria estavam ligados as questões comerciais da arte. É possível viver só de arte? Quem compra esse tipo de arte? Quanto custa?

Na necessidade de respostas, abri outra porta do meu atelier, a parte da escritora, poeta, ilustradora, que comercializa seus livros, da escultora de obras por encomenda, dos contatos com galerias de arte comerciais, que expõem minhas obras contemporâneas, mas comercializam as obras que o comprador de arte busca, ou seja, as que se adaptam aos espaços privados ou públicos que lhes foram destinados.

6. Considerações Finais:

Entre o ser ou parecer artista contemporânea:

Ser uma artista contemporânea significa viver num castelo dogmático, transformando meu discurso em aversão a qualquer debate que possa se impor e derrubar a frágil estrutura de areia que o sustenta.

Viver nesse castelo dogmático significa desabonar e desencorajar qualquer crítica que venha de fora de sua lógica. Nesse castelo a opinião de Ferreira Gullar, um gigante das artes brasileiras, seria taxada de reacionária e conservadora. E se a crítica vem de fora da grande muralha que cerca os dogmas da arte contemporânea, o resultado é mais desalentador, pois nos grandes salões de arte os críticos foram substituídos por bajuladores do artista em detrimento de sua arte.

Assumir o dogma do ser artista contemporânea significa pertencer a um clã fechado em suas próprias idéias e que age de forma coordenada com o objetivo de colocar em prática uma teoria pré-estabelecida de que a arte contemporânea tem que perpetuar e ritualizar Duchamp e a arte conceitual, para não correr os riscos de ser descoberta como uma fraude do fazer artístico. Pelo menos é o que vemos nos outros habitantes do castelo conhecidos como curadores, galeristas e artistas fazendo a todo momento. È nesse ponto que o parecer prevalece sobre o ser.

Negar os dogmas, questionando sua temporalidade e validade, é habitar alem das muralhas do grande castelo, é se misturar com os periféricos, os desconhecidos, os incultos, para quem o artista contemporâneo cria suas obras com o único objetivo de “criar estranhezas”, tão comentadas pela mídia especializada nesse tipo de arte. È comum nos depararmos com uma mídia enaltecendo que tal obra de tal artista provocou a interatividade da obra de arte contemporânea com o espectador, quando o convidou a entrar por túneis, salas, sentar em estranhos objetos pontiagudos, entre outras situações, mais ou menos constrangedoras, que segundo o dogma, é uma forma de dizer que espectador e artista estão em contato através daquela obra, que trata-se de um esforço intelectual para a interatividade e um reforço para a simultaneidade, que a obra acontece junto com o momento presente da visitação, que o espectador é a parte do mundo que se relaciona com a obra e vice-versa.

Segundo o dogma, o ser periférico e desconhecido tem que estabelecer um comportamento crítico sobre ele e o mundo ao seu redor através de uma seqüência de copos quebrados espalhados pelo piso de um conceituado Museu de Arte Contemporânea. Esse ser periférico e desconhecido precisa ser conscientizado de que é normal ter sentimentos de constrangimento ou embaraço em determinadas situações de contato com a arte contemporânea.

7. Conclusão:
A missão do arte-educador:

Cabe ao arte-educador perpetuar os dogmas da arte contemporânea, ou questiona-los, inovando na missão de entender, apreciar e fazer arte.

8. Fontes Consultadas:

Indicar uma bibliografia dentro das normas para envio de artigos científicos envolve duas dificuldades: a primeira que não usei citações de autores ultra-conhecidos nos cursos universitários de arte como G. Argan, H. Leichtt, W. Benjamin, B. Berenson, H. Eco, E. Gombrich, A. Hauser, M. McLuhan, P. Mondrian, E. Panofsky, C. Peirce. Segundo que os autores consultados na sua grande maioria apenas publicam suas impressões através dos blogs e sites temáticos na WEB, cuja autenticidade pode ser questionada.
Alem disso usei como fonte palavras, expressões e vivencias coletadas na memória do meu fazer arte junto com meus interlocutores.

Mesmo assim disponho de farta bibliografia sobre arte na minha biblioteca pessoal a qual consulto raramente, preferindo consultar publicações que funcionam como um manual, um resumo, do muito que já foi escrito sobre o mesmo tema com as mesmas conclusões como, por exemplo, o livro “A Historia da Arte do Século XX: idéias e movimentos, de autoria de Lucio Agra, publicado pela Editora Anhembi Morumbi, em 2004”.




[1] Este texto foi formatado de acordo com as normas para envio de Artigos Científicos, mas a redação transgride as mesmas normas.
[2] A autora é Mestre em Educação e Cultura pela UDESC, Universidade do estado de Santa Catarina, artista plástica, escritora. Presidente do Conselho Municipal de Cultura de Indaial/SC. Membro da Sociedade de Escritores de Blumenau/SC. Membro da Associação de Artistas Plásticos de Timbó/SC. Site: http://www.isabelmir.com.br/. E-mail: isabelmir@tpa.com.br. Endereço: Rua São Bento, 740, Timbó/SC. Telefone: (47) 3382-9951. Link currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3478862065354935
[3] O resumo histórico foi elaborado a partir e inúmeros resumos já publicados, digitalizados e colocados para consulta em inúmeras páginas de WEB dedicadas a arte.
[4] A teoria “arte-inteligente” carece de fundamentação teórica, pelo fato de que é uma autocrítica quando a autora ainda freqüentava os quadros acadêmicos como pesquisadora e professora universitária do departamento de Artes.
[5] As constatações são resultados das visitas feitas pela autora através de um olhar crítico, aos mais recentes Salões de Arte Contemporânea.
[6] O registro fotográfico das obras contemporâneas e das obras comerciais da autora pode ser conferido através do site: http://www.isabelmir.com.br/

[7] O grifo no termo é proposital e pretende criar estranheza no próprio texto.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Estamos iniciando uma nova era neste BLOG com 3 novas pessoas administrando e publicando material. Espero que a Nova editora chefe, a brilhante produtora cultural Isabel Mir tenha todo o sucesso do mundo, mas principalmente no Vale do Itajaí.

Marco Antonio Struve

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007





O dia em que o Weihnachtsmann apareceu de verdade!



Quem me contou foi o meu amigo Ivo Hadlich, aqui de Blumenau. Eles eram pequenos, cinco criancinhas em torno de uma mãe e de um pai, a esperarem a chegada do Natal e do Weihnachtsmann, todos dentro daquela emoção que toma conta da gente até hoje, quando o Natal está chegando. Pelas contas que fizemos, deve fazer uns 50 anos, tempo em que não havia loja de 1,99 cheinha de enfeites de Natal, nem neve artificial, e quando ainda eram caríssimas as bolas de vidro que tão facilmente se quebravam e deixavam um monte de finos cacos para entrarem na mão das crianças arteiras.
A mãe do Ivo, então, fazia as coisas da maneira antiga: enfeitava o pinheirinho com os doces-de-Natal mesmo, furados com uma agulha e pendurados na árvore, como frutos, para serem colhidos depois. Ele me contou o trabalhão que dava furar com uma agulha, também, duros grãos de milho, os mais coloridos possíveis, para formarem cordões que enfeitassem a árvore, bem como toda a criançada ajudava a fazer cordões de pérolas, com baguinha-de-Nossa-Senhora, para também embelezarem aquele símbolo maior numa casa, na época do Natal. E ainda se faziam pequenos bonecos de palha-de-milho, e eram colocadas velinhas coloridas por todo o pinheirinho, antes que a noite-de-Natal chegasse. Ficava o máximo o pinheirinho na casa do Ivo: não haveria Weihnachtsmann que não viesse até ali trazer presentes, só para ver coisa assim tão bem feita e linda!
E então chegou a noite-de-Natal de verdade, e quando as crianças entraram na sala, viram que o Weihnachtsmann viera mesmo! Sob a árvore enfeitada e agora com todas as velinhas acesas, estavam os pacotes com os presentes, que hoje ele sabe que eram coisas simples: carrinhozinhos de madeira, bonecas de pano, as coisas modestas que as crianças ganhavam então, naqueles tempos de antes do Consumismo.
E então todos se deram as mãos para cantar o Stille Nacht, a Noite Feliz de todo o mundo ocidental cristão, e o Ivo ainda se lembra muito bem como seu coração de menino muito pequeno batia violentamente, de tanta emoção... quando o incidente ocorreu! Nunca se soube como, mas alguma das velinhas coloridas deve ter caído, e o pinheiro todo se incendiou, e de árvore encantada um momento antes, transformou-se numa tocha que rugia e que queimava todos os enfeites e doces, e, de quebra, já foi incendiando as cortinas da janela e os presentes, e deixando todo o mundo apavorado com o que ocorria.
O pai do Ivo fez o que devia fazer, claro: buscou baldes com água, apagou tudo, salvou a casa. Mandadas para fora como garantia, as cinco crianças, abraçadas, choravam. O Weihnachtsmann viera e se fora, e mesmo assim eles tinham ficado sem Natal! Mas havia a mãe, claro, e as mães sempre salvam tudo. Era impraticável continuar o Natal naquela sala cheia de fuligem, água, e sobras da festa, e ela sabia o que ia nos coraçõezinhos dos seus filhos. Então chamou todos para fora, e o Ivo me jura que aquele foi o Natal mais bonito que ele teve na vida!
Havia uma grande noite de estrelas, lá fora – era como se o mundo todo tivesse se preparado para o Natal, era como se o céu tivesse se vestido de muitas velinhas para esperar a passagem do Weihnachtsmann que ainda deveria andar por ali por perto, visitando outras casas. A mãe do Ivo fazia questão das canções natalinas, e então, todos se deram as mãos de novo e começaram a cantá-las para as estrelas, a começar, claro, pelo Stille Nacht, bem de onde haviam parado. Já não tinham doces nem presentes, mas a noite mágica não foram perdida. E o Ivo jura que foi aquela a única vez em que viu o Weihnachtsmann de verdade: de repente, num caminho aberto entre as estrelas, lá ia ele, tocando um trenó puxado por renas, bem aquele trenó da qual certo refrigerante se apoderou, na década de 1930, quando resolveu inventar o Papai Noel. E o Weihnachsmann abanou, e o grande céu de estrelas ficou cheio de música. O Ivo nunca esqueceu, até hoje. Ele chorou, quando me contou.

Blumenau, 05 de Dezembro de 2003.


Urda Alice Klueger
Neste Natal

Não quero paz
Quero uma luta
Que faça a vida
Ter valido a pena
Não quero prosperidade
Se não puder compartilhar
Não quero muito amor
Mas muitas paixões
Não quero ganhar amigos
Quero perder os inimigos
Não quero ganhar o presente
Quero ter o futuro
Não quero receber um abraço
Quero abraçar todo mundo
Não quero ter medo
Quero ser coragem
E ser tudo o que quero
Neste Natal

Isabel Mir

dez/2007

terça-feira, 18 de dezembro de 2007





TODOS OS NATAIS

Por Luiz Carlos Amorim (escritor e editor - Http://br.geocities.com/prosapoesiaecia )


Em um novo dezembro, impossível evitar a lembrança de Natais passados, antigos, felizes, da infância da gente, abençoada infância.
Meus melhores Natais aconteceram quando eu ainda era criança. E depois, quando minhas filhas eram pequenas. Apesar de saber o significado da data, tão importante, acho que para mim, até por causa disso mesmo, crianças fazem falta na mágica noite. Porque elas representam a presença de um menino nascido nessa época e de quem comemoramos o aniversário.
Então espero os netos que, com certeza, reavivarão a chama daqueles Natais saudosos e autênticos. Enquanto isso, passamos a noite de véspera com amigos e parentes que tenham “guris pequenos”, ou os convidamos para passá-la com a gente. Como não ter a presença de uma criança numa noite dessas para mostrar-lhe o presépio e contar a sua história, ver o brilho dos seus olhos refletirem nas bolinhas da árvore natalina, ensinar-lhe a cantar as canções tão nossas conhecidas, vê-la ter medo do Papai Noel de mentirinha e abrir presentes com aquela ansiedade estancada de há tanto tempo?
Saudade de meus Natais de quando eu era criança. Também tinha medo do Velhinho, mas adorava os brinquedos e chocolates que ele trazia. Sabia que naquela noite nascera um Menino eterno, porque minha “Vó Pequeninha” me contara a sua história. Infelizmente, nunca foi montado um presépio em nossa casa, naqueles Natais antigos. Nem montei um, também, para minhas filhas.
Mas mesmo assim, aquelas noites eram mágicas. O encantamento começava muito antes, meses antes, quando o tempo custava a passar, até que chegasse o dia de enfeitar o pinheiro. Aí, sabíamos, a noite estava próxima, muito próxima.
E então era uma azáfama só. Todos ajudavam a preparar a casa, por dentro e por fora – as paredes, o jardim, o quintal, os gramados – sim, porque não morávamos em apartamentos, como hoje, mas em casas -, alguns “ajudavam” no que era possível (e no que não era) na feitura de doces e bolachas natalinas. Era época também de se estrear roupa nova, e lá íamos nós tirar medidas ou experimentar peças simples, de tecidos simples, mas que eram o quanto bastava.
E na véspera da noite especial, que finalmente chegava, todos estavam prontos. Era só esperar as visitas que vinham partilhar a ceia de Natal, simples mas farta, que a mãe preparava com tanta dedicação e carinho, a chegada do Velhinho com os presentes e então todos cantávamos aquelas canções tradicionais e lindas para saudar o nascimento daquele Menino.
Foram Natais felizes. Depois, bem mais tarde, no segundo ou terceiro Natal de minhas filhotas, fiquei triste porque havia “encomendado” um Papai Noel para vir visitá-las e a outras crianças que nos faziam companhia, e ele não apareceu. Ficara bêbado nas primeiras visitas e esquecera a nossa. Fiquei indignado com o homem, pobre mortal que não cumprira o combinado e deixara minhas filhas esperando. Mas não poderia deixá-lo tirar o encanto daquela noite única, e falamos do aniversariante, cantamos as canções que falavam dele e a magia foi restabelecida.
Num outro Natal, pude me sentir quase um Papai Noel. Comprei, aos poucos, bem antes que aquele Natal chegasse, balas, chocolates e pequenos brinquedos, fiz vários pacotes e fui, num sábado antes da tão esperada noite, visitar uma comunidade muito carente. Naquele lugar, de gente muito, muito pobre, sabíamos que as crianças não ganhariam nada de ninguém. Foi uma festa o que aconteceu ao redor do meu fusca, naquele dia.
E dentre tantos Natais felizes, um foi muito triste, para mim e para minha esposa: perdemos nossa primeira filha no final de um outubro, numa primavera linda, quando as primeiras flores de jacatirão começavam a desabrochar. E quando dezembro chegou, a ferida ainda doía muito e nunca uma criança – a nossa criança - fez tanta falta num Natal. Mas entendíamos que não perdemos nossa filha, apenas a deixamos ir ficar ao lado do pai do Menino que nascia mais uma vez. Em todos os outros Natais, por todos esses anos, aquela dor dói um pouquinho mais do que de costume, uma saudade antiga, um sentimento que parece ficar maior, então.
Mas as grandes perdas ensinam a gente a dar valor ao que se tem. Novos Natais felizes voltaram, assim como as crianças, que sempre voltam. Assim como o menino que sempre nasce de novo. Sempre.

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(MarcoStruve - Natal 2007 da APAE de Indaial)




Sim, sou presepista!
Por elaine tavares - jornalista

Tenho gravada nas retinas e no coração as imagens dos natais da minha infância. No início do mês de dezembro minha mãe começava a preparar a construção do presépio. Era uma tradição. Nós, os três filhos, participávamos organizando os personagens da famosa noite em que nasceu Jesus. A família, os bichinhos, os pastores, os reis magos, a estrela. A coisa levava o mês todo. Havia a árvore de natal, mas ela era absolutamente secundária. Porque minha mãe reverenciava o menino e não o Papai Noel. Naqueles dias, no interior do Rio Grande, o capitalismo selvagem ainda não tinha chegado com toda a sua força. Depois, eu cresci, e segui a velha tradição. Todo o natal, monto o presépio com todos os seus personagens. Passo o mês inteiro esperando pelo dia do aniversário daquele que tenho como uma das figuras que mais amo no mundo.

Sempre há os que dizem que ele não existiu, que é uma invenção de Paulo. A mim não importa. Tudo que sei é que as histórias que dele se contam, das coisas que ensinou, amparam minha prática de vida. Jesuânica. Por isso o natal é tão importante pra mim. Não que eu precise de um dia específico para lembrá-lo ou falar dele. Mas é um aniversário e é bom celebrar.

Por isso me agride a imagem gigante do Papai Noel que foi montada na entrada da cidade onde moro, Florianópolis, num chamado ao consumo. E me choca ver que as pessoas acham lindo e sequer questionam toda a carga de ideologia que aquele símbolo sustenta. Aqui, na ilha da fantasia, o natal é sinônimo de compras. A própria figura do Papai Noel perdeu seu sentido original, do bom velhinho que vinha visitar as crianças na noite do grande advento. Agora, natal significa consumo, louco, desenfreado. Nas telas da TV tudo o que se fala é da porcentagem do aumento das vendas e nas ruas já começa o frenesi dos pacotes.

Eu não dou presentes no natal. Busco o refúgio interior e o encontro com a idéia de Jesus, o cara do aniversário. Conspiro com as demais culturas originárias do hemisfério sul que celebram o solstício de verão. Faço minhas cerimônias, minhas rezas e celebrações. No dia do solstício, que é o 21, o sol parece ficar estacionado no céu. O dia é longo e a gente faz reverências àquele que nos dá calor e propicia a vida.

Então, natal é isso: festejar a vida. Celebrar com os que amamos a idéia de que o mundo precisa ser justo, que as riquezas devem ser repartidas, que as pessoas devem ser solidárias e amorosas. É dia de comungar com os ancestrais, com a natureza, com a vida que vive. Dia de agradecer por poder estar neste lindo jardim. Se há algo a presentear, que seja essa idéia, de que o natal não é um dia para comprar presentes impessoais, impostos pelo mercado capitalista. O natal é dia de armarmos nosso presépio interior, com todos os personagens do nosso grande advento.

Feliz Natal... Feliz Solstício... !!!




NATAL RENOVADO


Por Luiz Carlos Amorim (escritor – http://br.geocities.com/prosapoesiaecia )


O Natal está chegando e eu recebo, no último dia de novembro, assim tão cedo, o meu presente de Natal. Trata-se da quarta edição, ampliada, do livro "Crônicas de Natal e histórias da minha avó", da minha amiga Urda Alice Klueger. É claro que eu já tinha um exemplar da primeira edição, mas o livro está renovado, com capa nova, novas crônicas, quatro delas, e eu não podia deixar de lê-las de imediato. Então, acabo de ler "A Galinha de Vidro", "O dia em que o Weichnachtsmann apareceu de verdade", "Natal em Abril" e "Natal no Cinema".


Urda sabe como ninguém contar histórias e sendo de Natal, então, nem se fala. "A Galinha de Vidro" eu já conhecia, fala de perdas e de ausências que doem mais no Natal e eu sei bem como é;


"O dia..." é uma história mágica de um Natal que poderia ter sido destruído, mas transformou-se no mais bonito, quase como um que eu conheço; "Natal em Abril" é a história de um Papai Noel que veio fora de época para mostrar a um menino que a magia do Natal existe. Idenfiquei-me com essa história do rapaz que comprou a bicicleta tão sonhada com o primeiro salário (e Papai Noel veio para entregá-la), pois Urda pergunta, entre parêntesis, se o leitor lembra da loja "Hermes Macedo".


Eu lembro, Urda. Foi lá que eu conheci minha esposa, a mãe de minhas filhas. Um dia escrevo uma crônica. E "Natal no Cinema" é a crônica sobre um certo Papai Noel de Urda, que transformou um conto das primeiras edições deste mesmo livro em filme.E quando leio a crônica sobre o filme "Por causa de Papai Noel", lembro que a minha crônica do Natal do ano passado era exatamente sobre isso: meu presente de 2006 foi poder assistir ao filme, uma obra que consegue retratar com fidelidade o talento de escritora de Urda, o talento da diretora em transportar para a tela a excelência literária da escritora e, além de tudo, mostra um pouco da infância da própria autora do texto.


E lembro, por associação, do CD com músicas de Natal que dei pra Urda naquele final de 2006, bem no dia em que assistimos junto "Por Causa de Papai Noel". O CD, na verdade, é uma seleção que fiz de vinte músicas de Natal brasileiras, portuguesas, cantadas, orquestradas, há até duas músicas interpretadas por um coral de crianças de escola do qual fazia parte minha filha Daniela, quando era bem pequena. Algumas músicas são bem conhecidas, tradicionais, cantadas por cantores famosos e atuais, mas outras são músicas belíssimas, mas desconhecidas por muitos de nós. Ela só pôde ouvir depois de passado algum tempo, pois vive numa correria constante, e ficou encantada, disse-me que anda com o disco no carro para ouvi-lo sempre que pode.


Esse menino que nasce todo dezembro renova, mesmo, a alma das pessoas, e tudo é motivo para alegrar o coração da gente. Como as canções natalinas que agradaram tanto a Urda e como as crônicas de Natal dela que agradam e emocionam tanto a gente.



A galinha de vidro




Uma das coisas mais bonitas que tinha na casa dos meus avós era um porta-jóias em forma de uma galinha de vidro, numa cor entre o laranja e o ferrugem. Eu era louca por aquela galinha de vidro colorido (até hoje gosto de coisas de vidro colorido – será que tudo começou lá?).
Pois bem, um dia meus avós desfizeram-se de sua casa e foram morar com uma filha, e adivinhem quem ganhou a galinha de vidro colorido? Euzinha mesmo, sem mais nem menos. Com certeza aquela era a peça mais bonita que eu possuía, e durou vários anos nas minhas mãos: era criança quando a recebi; era adolescente quando, um dia, deixei-a espatifar-se no chão. Aquilo foi uma tragédia para mim! Juntei caco por caco e guardei tudo dentro de uma camiseta velha, na esperança de que um dia a Ciência produzisse algum tipo de cola que me permitisse refazer a minha galinha. Ela estava sempre lá, no fundo do armário, a me fazer lembrar de como fora linda e garbosa, nos seus tempos de porta-jóias, plácida e gorda galinha deitada num ninho também de vidro – como esquecê-la?
O tempo passou. Eu já tinha 30 anos quando o meu pai faleceu, tão cedo ainda! Houve toda a tristeza da doença, da morte, do enterro... Todas as famílias já passaram ou passarão por coisas assim. Meu pai morreu em agosto, e logo depois da sua morte minha mãe avisou-me que ele já havia comprado o meu presente de Natal, antes de ficar doente. Queria eu ganhá-lo logo?
- Não, mãe, deixe para o Natal, como era a vontade dele.
Quisemos que aquele Natal fosse diferente, para que não ficássemos todos dentro de casa lembrando, nos emocionando e chorando. Achamos por bem irmos todos acampar, e o fizemos. Fomos para Armação do Itapocoroy, lá onde eu passara os grandes verões da minha adolescência, e eu inaugurava moderna panela elétrica que permitia fazer todo o tipo de comida num camping, e passei a tarde do dia 24 cozinhando, fazendo desde esmerado pernil à Califórnia, até maionese de batatas e tudo o mais que pudesse compor uma boa mesa de Natal. E a noite mágica foi chegando, e nas nuvens iluminadas pelo pôr-do-sol que apareciam pelas beiras da baía de Armação já parecia que havia muitos mistérios escondidos – numa hora o sol se foi, e deixou, ainda por algum tempo, uma fímbria de ouro nas nuvens – e depois ele se foi mesmo, e o horizonte ficou róseo e azul, bem como devem ser as cores dos anjos – e nós espiávamos tudo aquilo enquanto degustávamos o jantar de Natal, e o mistério daquela noite estava mesmo aumentando e nos deixando cheios de ansiedade!
Então escureceu, e era hora de abrirmos os presentes. Os meus sobrinhos ainda eram pequenos, e havia aquela coisa do Papai-Noel ter passado por ali sem que víssemos, e olha lá a boneca nova da Rosa Maria! E olha lá a caixa nova de lápis de cor do Mteka! E olha lá o estojo de maquilagem da Anna Paula! E olha isso, e olha aquilo... quando minha mãe achegou-se a mim com um embrulho de papel de seda, e fez-me lembrar:
- O teu pai tinha te comprado o presente de Natal antes de morrer...
Só aquilo já fazia engolir em seco – cuidadosamente, desembrulhei o papel de seda... e o que havia lá dentro? Nada mais nada menos do que uma galinha de vidro igual àquela da casa da minha avó, que meu pai vira no começo do ano em alguma loja, e que aproveitara para comprar já, pois sabia o quanto eu gostaria dela! Quatro meses depois da sua morte meu pai ressuscitava e me dava aquele porta-jóias de vidro ao qual eu dava tanto valor, era como se ele viesse e me dissesse:
- “Estás vendo? Sei direitinho o teu gosto!”
Que restava a mim fazer, então, do que sentar-me na grama e chorar?



Blumenau, 12 de Novembro de 2003.


Urda Alice Klueger
Somos nossos heróis
Por elaine tavares - jornalista

Maluca por cinema eu vejo tudo que há. Não importa a qualidade. Mesmo nas “bombas” estadunidenses sempre há algo que se possa tirar, desde que tenhamos olhos críticos. Dentro delas há um gênero de que gosto demais. É o dos super-heróis. Encantam-me com suas sempre bondosas tentativas de salvar o mundo. E não é à toa que a indústria cultural os mostre assim. Solitários, um pouco tristes, salvadores individuais. A vida de todos gira em torno da boa vontade de um, o que tem os super-poderes. Talvez por isso me enterneça uma cena do Homem-Aranha em que ele, cansado de salvar o mundo, passa a se comportar como pessoa comum. Só que não consegue. O mundo precisa dele, e ele volta. E o salva. Eis a sempre repetida mensagem do way of life estadunidense. “Fique tranqüilo, alguém virá te salvar. De preferência um dos nossos”.

Cá com meus botões fico a pensar se essa lógica dos super-heróis não é afinal a que temos de combater. Estamos sempre esperando o salvador. Aquele que, num átimo, virá, com suas roupas coloridas e super-força nos salvar. Com os olhos no céu esperamos a saída individual, o gesto do outro, o herói. Esquecemos as propostas coletivas, a necessidade da união, as lutas travadas em comunhão. Ah, essa fortaleza que desconhece seu poder.

Agora aí está, nosso frei Luiz Cappio, outra vez colocado, sozinho, diante da monstruosa idéia da transposição do Rio São Francisco. Ele que é magrinho, que não tem capa, nem super-poderes. Ele que é só um homem, demasiado frágil, demasiado só. E o que ele quer? Bancar o herói? Não! Ele quer que nos recordemos (voltar ao coração). Quer que a gente se lembre dos tempos imemoriais em que, juntos, superávamos nossos medos e as ameaças que se colocavam diante da raça. Desesperadamente quer que nossos ouvidos se abram e possamos voltar a ouvir a canção da comunhão. Juntos, povo, comunidade.

O frei Luiz não quer piedade, nem lágrimas, nem lamúrias. Ele quer ação. Ação nossa, conjunta, real. Frei Luiz não quer lamentos. Quer o povo em pé como se fosse uma copa do mundo, a bramir bandeiras e a se dirigir, cego, para o canteiro de obras da transposição, como cegas vão as gentes para as olimpíadas ou campeonatos. Só que, neste caso, não é um jogo de bola. É o destino de milhares de pessoas que vai se decidir.
Frei Luiz quer que as pessoas saibam que, conforme atestam centenas de relatórios e estudos feitos por técnicos gabaritados, a transposição vai ser um desastre para as pessoas e para a natureza. A Fundação Joaquim Nabuco mostra que, com a obra, vai haver uma redução brutal na geração de energia. O Instituto Miguel Calmon diz que pode faltar água ao rio, pois os afluentes são temporários, e a retirada de água só vai piorar as coisas. O Comitê Executivo de Estudos Integrados da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco-CEEIVASF, diz que a obra pode provocar uma maior evaporação das águas, que já é elevada no semi-árido. Na verdade, só vai ser bom mesmo para as empreiteiras, que ganharão astronômicas quantias para fazer a obra e para os latifundiários, que poderão irrigar suas terras sem maiores investimentos.
Frei Luiz está jejuando, está pedindo socorro, como se ele mesmo fosse o rio. É porque ele sabe que não existem super-homens, nem homens-aranha, nem madrakes. Como homem, desgraçadamente homem, ele sabe que só há um jeito para parar as máquinas. A força e a união de todas as gentes. Por isso só há dois jeitos de salvar o padre, o rio e a nós mesmo. Ou vamos todos para Sobradinho, na Bahia, ou fazemos ações em nossos estados. Mas ações fortes, firmes, capazes de serem ouvidas pelos governantes! Nada de moções. Ações. Nós, de camisa verde-amarela, com nossas bandeiras, nossos sonhos, nossas esperanças. Para barrar a obra. Afinal, há outras soluções para a questão da água no nordeste. Centenas delas, dadas por técnicos competentes.
Só assim, agindo concretamente, a gente salva o rio, a vida, o frei. Esse homem que se entrega em oblação, porque nós ainda precisamos de heróis. Penso que será muita covardia da gente deixar frei Luiz sozinho. Ele nos quer, juntos. Não quer estar sozinho. Sejamos, então, milhões...